Por Flávia Albuquerque - Repórter da Agência Brasil
A Revolução Constitucionalista de 1932 completa 92 anos nesta terça-feira (9), data considerada magna no estado de São Paulo por ter marcado o conflito armado entre forças paulistas que tinham por objetivo derrubar o governo de Getúlio Vargas. O militar gaúcho havia assumido a presidência do governo provisório nacional após um golpe de Estado decorrente da Revolução de 1930, contra o presidente eleito Júlio Prestes, representante da política paulista.
O dia tornou-se feriado estadual em 1997, com a aprovação da Lei 9.497 pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e promulgada pelo ex-governador Mário Covas, que instituiu o 9 de julho como Data Magna de São Paulo.
Outra causa do conflito foi a ruptura da política do ‘café com leite’, a alternância de poder entre as elites de Minas Gerais e São Paulo, que caracterizou a República Velha (1889-1930). Indignados com a situação, setores da sociedade paulista passaram a promover grandes mobilizações populares contra o governo, que se estendiam para outros estados como Minas Gerais, Alagoas e Rio Grande do Sul.
No Rio de Janeiro, em 1931, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) organizou uma manifestação contra a carestia, violentamente reprimida. O estopim da fase armada do levante foi uma manifestação no dia 23 de maio de 1932, na Praça da República, onde ficava a sede do governo do interventor nomeado por Vargas.
Foi nessa ocasião em que um conflito após uma invasão a um escritório do Partido Popular Paulista deixou mortos quatro estudantes: Mario Martins de Almeida, Euclydes Bueno Miragaia, Dráusio Marcondes de Souza e Antônio Américo de Camargo Andrade, que passaram a ser mártires do movimento, que adotou a sigla MMDC, com as iniciais dos nomes dos estudantes. Um quinto manifestante morreu dias depois no hospital.
A rebelião armada estourou no dia 9 de julho e voluntários começaram a se apresentar para engrossar o exército a favor da causa paulista. As operações militares começaram no dia 12 de julho com frentes de batalha nas divisas com o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e no litoral, com pelo menos 50 mil homens. Entretanto, o exército federal era bem maior e melhor equipado, com cerca de 100 mil pessoas, e São Paulo acabou perdendo o apoio dos outros estados, exceto do Mato Grosso.
A batalha durou três meses e acabou com a rendição dos paulistas no dia 2 de outubro. Em maio de 1933, foram realizadas eleições para a Assembleia Constituinte e, em novembro, foi elaborada a Constituição brasileira, promulgada pelo presidente Getúlio Vargas, em 1934.
Polêmicas
Segundo o historiador Francisco Quartim de Moraes, as causas para que São Paulo se levantasse em uma guerra civil contra o resto do país são, além de complexas, motivo de polêmica. Moraes explicou que parte da oligarquia paulista, sobretudo aqueles que estavam ligados ao Partido Republicano Paulista, buscavam a retomada do poder, quase hegemônico, que exerceram durante toda a Primeira República.
“Esse poder foi colocado em cheque pela Revolução de 1930. Também lhes motivava o medo de uma Revolução Social mais radical. Outro grupo político, o Partido Democrático, havia apoiado o movimento de 30, mas se sentia alijado dos rumos que o Governo Provisório tomava. Durante a interventoria de João Alberto, nomeado para o cargo por Getúlio Vargas, a crise se agudizou exponencialmente’, disse o historiador.
De acordo com Moraes, o novo interventor, socialista e revolucionário, ex-comandante de um destacamento da Coluna Miguel Costa-Luis Carlos Prestes, tomou uma série de medidas que assustaram o poder político e econômico paulista. Entre elas, houve a promulgação de leis trabalhistas e a tentativa de legalização do Partido Comunista do Brasil no estado de São Paulo.
“Se no início a campanha paulista se centrou no pedido da nomeação de um interventor ‘paulista e civil’ em oposição a João Alberto, que era pernambucano e militar, depois que Vargas nomeou interventores paulistas e civis, como o próprio Pedro de Toledo, que seguiu como governador de São Paulo mesmo durante o movimento armado iniciado em 09 de julho, essa campanha perdeu o seu sentido”, diz o historiador.
Segundo ele, o mesmo ocorreu com a campanha que dá nome oficial ao movimento, quando paulistas (e também outras figuras de todo o país) clamavam pela reconstitucionalização do país. Se em um primeiro momento essa campanha teve força e encontrou eco no pensamento de muitos brasileiros, depois que Vargas promulgou o Código Eleitoral em 24 de fevereiro de 1932, com medidas como o voto feminino, a justiça eleitoral e o voto secreto, e depois marcou oficialmente, em 14 de maio de 1932, a data para que ocorresse a constituinte de 1933-1934, essa argumentação perdeu a maior parte de sua força.
“Ambas as datas são anteriores ao levante de 9 de julho e, portanto, não podem ter sido resultado da guerra civil. São Paulo buscava retornar à federalização garantida pela constituição de 1891. Isso era explícito nos discursos e manifestos do movimento paulista. Enquanto a Revolução de 30 havia tido um caráter centralizador”, explicou.
Para Moraes, embora muitos autores indiquem que a reconstitucionalização seja um legado do movimento paulista de 1932, isso não condiz com a ordem dos fatos. “A reconstitucionalização do país já estava completamente estruturada, nos moldes em que ocorreu meses antes do início da guerra civil. O legado concreto de 1932 é a criação de um sentimento de identidade no povo paulista, o que hoje podemos chamar de paulistaneidade. Realçada todo 9 de julho e que teve no quarto centenário da cidade, em 1954, um momento chave com a criação do Obelisco do Ibirapuera”, finalizou o historiador.
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