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Postado às 09h30 | 13 Out 2019 | Redação Santa Dulce dos Pobres, a primeira santa brasileira é canonizada pelo papa Francisco

Crédito da foto: Arquivo Irmã Dulce Irmã Dulca, a primeira santa nascida no Brasil

Santa Dulce dos Pobres. É assim que Irmã Dulce passa a ser chamada após a cerimônia de canonização que a tornou santa na manhã deste domingo (13) na Praça de São Pedro, no Vaticano, lotada de fiéis.

A santa, conhecida popularmente como Anjo Bom da Bahia, foi uma das religiosas mais populares do Brasil graças ao trabalho social prestado aos mais pobres e necessitados, principalmente na Bahia.

O Vaticano considera que Santa Dulce dos Pobres é a primeira santa brasileira. Embora outras brasileiras e uma religiosa que atuou no país tenham sido canonizadas pela Igreja Católica anteriormente, irmã Dulce é a primeira mulher nascida no Brasil que teve milagres reconhecidos.

Outros quatro beatos, de diferentes nacionalidades, também foram canonizados por Papa Francisco às 10h35 (5h35 no horário de Brasília) deste domingo (leia mais abaixo). De acordo com o Vaticano, 50 mil pessoas participaram da cerimônia.

"Em honra da Santíssima Trindade, pela exaltação da fé católica e para incremento da vida cristã, com autoridade de nosso senhor Jesus Cristo, os santos apóstolos Pedro e Paulo, depois de haver refletido longamente, ter invocado a ajuda divina e escutado o parecer de muitos irmãos do episcopado, declaramos e definimos santos os beatos: John Henry Newman, Giuseppina Vannini, Mariam Thresia Chiramel, Dulce Lopes Pontes e Marguerite Bauys", declarou o Papa, em latim.

O chamado "rito de canonização" ocorreu na missa de domingo celebrada pelo Papa. Após um canto de entrada, o Papa abriu a celebração e, em seguida, houve um canto de “invocação do Espírito Santo”. O ato é uma forma de pedir a Deus que o ajude a tomar uma decisão acertada.

Depois, em uma "ladainha" — uma oração cantada —, a Igreja invocou a intercessão de todos os outros santos. Em seguida, foi lida a fórmula de canonização. Depois da leitura da fórmula, em latim, os cinco beatos foram considerados santos. A partir daí, houve um canto de comemoração e a missa seguiu como ocorre nos demais domingos.

Além de Irmã Dulce, foram canonizados:

- o teólogo e cardeal inglês John Henry Newmann, um dos principais intelectuais cristãos do século 19;

- a religiosa italiana Giuseppina Vannini;

- a religiosa indiana Mariam Thresia Chiramel Mankidiyan;

- a catequista suíça Margherita Bays.

Na homilia da missa de canonização, o Papa Francisco afirmou que as pessoas que se dedicam ao serviço dos mais pobres na vida religiosa fizeram "um caminho de amor nas periferias existenciais do mundo".

Francisco disse que, como os leprosos citados nos textos bíblicos, "todos nós precisamos de cura" e somente Jesus oferece essa cura. Por isso, segundo ele, é preciso rezar, pois "a oração é o remédio da alma''.

A cerimônia foi acompanhada por autoridades brasileiras como o vice-presidente, Hamilton Mourão; o governador da Bahia, Rui Costa; o prefeito de Salvador, ACM Neto; e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre.

O príncipe Charles, do Reino Unido, também participou da missa (veja vídeo abaixo). Um dos santos que estavam sendo canonizados é britânico.

Antes da missa, a cantora baiana Margareth Menezes, o padre Antonio Maria e o sanfoneiro cearense Waldonys tocaram e cantaram no altar a música oficial da canonização.

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O ANJO BOM DA BAHIA DEDICOU A VIDA AOS POBRESDa Agência Brasil

Na primeira quinzena de agosto deste ano, a professora aposentada Miralva Tito Moreno Oliveira, 74 anos, preparava-se para um procedimento cirúrgico no Hospital da Bahia, em Salvador, para retirada de cálculos que podiam chegar ao ureter, quando o médico a informou que não seria mais necessária a operação.

Arquidiocese de Brasília realiza procissão durante Festa da Padroeira - Nossa Senhora Aparecida, na Esplanada dos Ministérios  (foto: Marcello Casal JrAgência Brasil)

“Dona Miralva, a senhora não tem a pedra mais”, disse o urologista conforme relato da paciente à reportagem. De acordo com o exame pré-operatório feito no hospital, o cálculo não estavam lá. Miralva Oliveira temia dor e desconforto se as pedras chegassem e crescessem no ureter. O risco havia sido detectado por um exame de ultrassom e confirmado por ressonância magnética.

A paciente mostrou, então, ao médico o santinho impresso da beata Irmã Dulce, que ela mantinha sobre o abdome, pedindo intercessão de Irma Dulce, a futura Santa Dulce dos Pobres. Emocionada, Miralva Oliveira descreve ter recebido “uma graça” do “Anjo Bom da Bahia” que foi canonizada hoje (13) pelo papa Francisco na Praça São Pedro, no Vaticano; e se tornou a primeira santa brasileira. A celebração litúrgica reuniu cerca de 50 mil pessoas.

A ex-paciente comemora a canonização da religiosa, "uma santa brasileira e baiana! A gente só pode ter orgulho de louvar a Deus”, diz Miralva.

Para a pesquisadora baiana Thiaquelliny Teixeira Pereira, que escreveu tese de doutorado sobre a construção social da santidade, Irmã Dulce já é considerada santa pelos brasileiros e, em especial, pelos baianos. "População brasileira é pouco entendida na questão da liturgia, é um povo de muita fé e de pouco conhecimento teológico", observa. "[Há] Pessoas que são cultuadas pela população baiana à procura de milagres, de terem suas aflições respondidas", revela a pesquisadora.

Conforme o jornalista Graciliano Rocha, autor da biografia Irmã Dulce, a santa dos pobres, são comuns relatos de fieis, como Miralva Oliveira, descrevendo recuperação da saúde e o recebimento de outras graças após fazer orações e promessas à Irmã Dulce.

“Há um imenso mosaico de fé popular. A devoção à Irmã Dulce mobiliza todo o tipo de gente, de qualquer classe social”, descreve o biógrafo que realizou pesquisa por oito anos no Brasil, no Vaticano e até nos Estados Unidos. Segundo ele, nos vinte anos após a morte da beata (entre 1992 e 2012) mais de 10 mil relatos de graças foram descritos em cartas de fieis.

“É impossível não perceber beleza na devoção das pessoas”, observa o biógrafo após leitura de amostra dessas mensagens para escrever o livro. Há nas cartas “a inquietação genuína dos devotos”, principalmente de “causas ligadas à saúde”.

Irmã Dulce em visita aos doentes - Acervo Irmã Dulce

 

HOSPITAL NO LUGAR DO GALINHEIRO

Para o Graciliano Rocha, a vinculação à saúde tem muito a ver com o trabalho e o legado que a beata deixou após 60 anos dedicados à vida religiosa e à assistência aos mais pobres. Atualmente, as Obras Sociais Irmã Dulce (Osid) contabilizam 2,2 milhões de procedimentos ambulatoriais por ano, e dispõem de 954 leitos em cinco hospitais.

Segundo descreveu Maria Rita de Souza Brito, sobrinha da freira e superintendente das Osid, à agência de notícias do Vaticano, o complexo hospitalar interna, por ano, 18 mil pessoas, realiza 12 mil cirurgias, atende 11,5 mil pessoas em tratamentos de câncer.

As obras sociais tiveram início no ano de 1949, quando Irmã Dulce ocupou um galinheiro ao lado do Convento Santo Antônio para cuidar de 70 doentes. Onze anos depois, a futura santa cuidava de um hospital que dispunha de 160 leitos.

“Era um momento que não havia direito à saúde pública. As pessoas para serem atendidas em hospital público tinham que ter carteira de trabalho assinada. O hospital dela era o único que não rejeitava ninguém. Isso foi fundamental para que o colapso da cidade de Salvador não tenha sido pior na segunda metade do século 20. Isso é a base da santidade que ela tinha em vida”, avalia o biógrafo.

Sérgio Lopes, assessor corporativo das Osid, avalia que erguer a infraestrutura de atendimento hospitalar - e que também oferta ensino fundamental para 750 crianças e adolescentes, e fornece 1,7 milhão de refeições gratuitas por ano – “foi o primeiro milagre de Santa Dulce dos Pobres.”

O assessor crê que a canonização “vai aumentar a visibilidade” do trabalho da Osid e ajudar o fechamento das contas. O atendimento à saúde é feito graças a convênios com o Sistema Único de Saúde (SUS).  No ano passado, o dinheiro não foi suficiente. Conforme Lopes, restou um déficit de R$ 11 milhões que foi coberto posteriormente por repasses do Ministério da Saúde e doações, que equivalem a 5% do orçamento anual.

Irmã Dulce em comunidade pobre da Bahia (Acervo Irmã Dulce)

INVASÃO DE CASA

Assim como a história do galinheiro transformado em hospital, outras passagens alimentam a visão de que Irmã Dulce dedicou sua vida a acolher as pessoas mais humildes, como um menino ardendo em febre que a procurou pedindo para “não morrer na rua”. De acordo com o biógrafo Graciliano Rocha, o menino tinha 15 anos, trabalhava vendendo jornal na rua, era franzino e, provavelmente, sofria de malária. "Foi a primeira pessoa que a futura santa tirou das ruas", relembra Graciliano.

O local era próximo à Igreja do Bonfim, e ao avistar uma casa vazia e fechada, Irmã Dulce pediu a um passante que arrobasse o imóvel, assegurando que ela assumiria a responsabilidade. A freira providenciou colchão e um candieiro para o menino passar a noite, forneceu alimento, pediu que a irmã do pároco da Igreja do Bonfim cuidasse do garoto. Ela depois voltou com o médico.

“Irmã Dulce atendeu o menino. No dia seguinte, tinha diante de si uma cancerosa, que ela atendeu. Depois apareceram mais alguns necessitados, e ela foi atendendo”, complementa Dom Murilo Krieger, arcebispo de Salvador, em entrevista por escrito à Agência Brasil. O arcebispo ressalta que Irmã Dulce “era de baixa estatura, pesava somente 45 quilos, tinha uma saúde muito precária, dormia três ou quatro horas por noite etc. E, no entanto, foi à luta. Foi fazendo o que podia fazer, à medida em que os desafios se multiplicavam à sua frente”.

O religioso também assinala que “mais e mais as pessoas estão descobrindo a importância da vida de Irmã Dulce e do legado que nos deixou. E isso é muito importante porque o número de pobres, doentes e necessitados só aumentou e, por isso, há necessidade de muitas outras Irmãs Dulce.”

“O trabalho de Irmã Dulce era dedicado aos pobres mais pobres, aos desvalidos, aos sem casa, aos que estavam na sarjeta: o marginal, a prostituta, o bandido. Ela tinha o coração aberto a todo mundo”, comenta o advogado Antônio Gilvandro Martins Neves, que conheceu Irmã Dulce no final dos anos 1960 e teve sua ajuda para fundar uma casa de estudante em Salvador e depois manter um hospital beneficente em Paramirim, no interior da Bahia.

O biógrafo Graciliano Rocha acredita que a dedicação aos mais humildes pesou favoravelmente na decisão de canonizar Irmã Dulce. “Ela via no pobre a figura de Jesus Cristo a ser acolhido. Esse era o imperativo ético e religiosos que a movia”, comenta. Para a Thiaquelliny Teixeira Pereira, a canonização de Irmã Dulce não vai reverter o quadro social que se agrava segundo estatísticas oficiais que atestam aumento de pobreza e desigualdade, “mas é sempre bom ter em evidência alguém reverenciável que olha para os pobres”.

Fonte: Agência Brasil

 

TRAJETÓRIA DE FÉ E CARIDADE DO ANJO BOM DA BAHIA - Por Mariana Belo, G1 BA

Fé, devoção, caridade e acolhimento aos pobres são algumas das características marcantes de Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes, mais conhecida como Irmã Dulce.

Filha de Augusto Lopes Pontes, dentista e professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e de Dulce Maria de Souza Brito Lopes Pontes, a religiosa baiana nasceu em 26 de maio de 1914, em Salvador.

Desde cedo, mostrou à família e a todos que precisavam dela que sua missão na terra era estar perto daqueles que necessitavam de ajuda. Principalmente as pessoas enfermas e pobres.

Aos 7 anos, a mãe morreu e, aos 13, ela já acolhia mendigos e doentes na casa onde morava com o pai e os irmãos, no bairro de Nazaré, na capital baiana.

Já adulta e freira, ela ajudou operários do bairro de Itapagipe, em Salvador, a formarem a União Operária São Francisco, que logo depois se transformou em Círculo Operário da Bahia.

Junto aos trabalhadores, Maria Rita inaugurou colégio para os filhos dos operários e ainda ajudou a fundar os cinemas Plataforma e São Caetano. A renda obtida nos cinemas contribuía para a manutenção do Círculo Operário.

Ao longo da vida criou as Obras Sociais Irmã Dulce, na Cidade Baixa, e fundou o Hospital Santo Antônio, que faz parte do complexo das Obras. Irmã Dulce salvou vidas, tirou pessoas do vício em drogas, deu esperança a adolescentes abandonados e fez tudo isso com muito trabalho e dedicação.

Fonte de amor e cuidado com os pobres na terra, após a morte, ela também atendeu aqueles que a clamaram em momentos difíceis e fez milagres na vida dessas pessoas. Como foi o caso do maestro baiano que voltou a enxergar 14 anos depois de ficar cego.

Por conta desse e de outro milagre, Irmã Dulce se tornará a Santa Dulce dos Pobres, após cerimônia de canonização marcada para 13 de outubro deste ano.

A vida religiosa de Maria Rita começou aos 18 anos, quando, após se formar como professora primária, ela ingressou na Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus. A congregação ficava no Convento de Nossa Senhora do Carmo, na cidade de São Cristóvão, estado de Sergipe.

Viveu em Sergipe por cerca de seis meses, no ano de 1933, quando iniciou a vocação religiosa no Convento de São Francisco, em São Cristóvão, através da Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus.

Somente aos 19 anos, mais especificamente em 13 de agosto de 1933, que Maria Rita recebeu o hábito de freira e adotou o nome de Irmã Dulce em homenagem à mãe que chamava-se Dulce Maria.

Em seguida, ela deixou São Cristóvão e voltou para Salvador. No ano de 1935, quando ela tinha cerca de 20 anos, iniciou a assistência à comunidade carente, sobretudo nos Alagados, conjunto de palafitas que foi formado no bairro de Itapagipe, na capital baiana.

Nessa mesma época, estreitou os laços com os operários, em Itapagipe. Ainda no bairro, Irmã Dulce criou um posto médico e chegou a ser chamada de Anjo dos Alagados.

Em um ato que ficou bastante conhecido pelos baianos e que definiu o futuro da ação social e religiosa de Irmã Dulce, em 1939, ela invadiu cinco casas, em um local de Salvador conhecido como Ilha dos Ratos. Nos imóveis ela acolhia enfermos e desabrigados.

Cerca de nove anos depois, foi expulsa da Ilha dos Ratos. Diante da falta de um espaço para atender e colocar as pessoas, Irmã Dulce precisou peregrinar durante uma década, instalando os doentes em vários lugares, até transformar um galinheiro do Convento de Santo Antônio em albergue, o que, mais tarde, deu origem ao Hospital Santo Antônio, no Largo de Roma, em Salvador.

No dia do aniversário, em 26 de maio do ano de 1959, a religiosa Fundou a Associação Obras Sociais Irmã Dulce. No ano seguinte, inaugurou o Albergue Santo Antônio, com 150 leitos.

Daí em diante, os projetos de Irmã Dulce só expandiram e as Obras Sociais começaram a crescer. Em 1983, ela inaugurou o novo Hospital Santo Antônio, com 400 leitos.

A luta de Irmã Dulce pelas pessoas pobres e carentes foi reconhecida dentro e fora do Brasil. Ela conheceu, pessoalmente, o Papa João Paulo II e chegou a ser indicada para o Prêmio Nobel da Paz, em 1988, pelo então presidente da república, José Sarney, com o apoio da Rainha Sílvia da Suécia. Ela não ganhou o prêmio, mas teve o trabalho reconhecido e apresentado para o mundo.

O primeiro encontro da beata com o Papa foi em 1980, durante uma visita dele à Bahia. Onze anos depois, em 1991, quando estava doente e acamada, ela recebeu a visita de João Paulo II, pela última vez.

No dia 13 de março de 1992, 13 dias antes de completar 78 anos, ela morreu no Convento Santo Antônio, situado na Avenida Dendezeiros, na Cidade Baixa.

No dia 15 de março, ela foi sepultada no altar do Santo Cristo, na Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia, também na Cidade Baixa.

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