Terça-Feira, 25 de fevereiro de 2025

Postado às 11h15 | 06 Jan 2019 | Teoria do louco

Crédito da foto: Reprodução Donald Trump, presidente dos Estados Unidos

(*) João Paulo Jales dos Santos

A corrida presidencial de 2020 já começou. Como é de praxe, assim que termina um ciclo eleitoral americano, inicia-se em poucos meses, o próximo. Elizabeth Warren, democrata reeleita para o Senado pelo estado de Massachusetts, anunciou nesta semana que estará concorrendo as primárias na indicação presidencial democrata. Warren é uma das líderes e expoentes do movimento progressivo, que está mais à esquerda, do establishment do partido democrata.

O movimento progressivo, também denominado progressista, pode ter ainda as prováveis indicações de Kamala Harris, senadora eleita em 2016 pelo estado da Califórnia, além de uma provável candidatura de Bernie Sanders, reeleito pelo estado de Vermont. Convém aguardar se adiante, outros nomes vinculados ao movimento progressista, anunciarão candidatura. De todo modo, com Warren, que em 2016 não chegou a apoiar publicamente Bernie Sanders, a ala mais à esquerda do partido democrata inicia uma caminhada que vem almejando com mais anseio desde a derrota de Hillary Clinton em 2016, chegar a posição de liderar o partido.

A ala quer tirar das mãos o poderio que os moderados centristas neoliberais detêm. Com a derrota de Hillary em Michigan, Pensilvânia e Wisconsin, tradicionais estados democratas que reúnem uma influente classe trabalhadora, chegou-se ao consenso entre os liberais-progressistas, que já estava na hora do movimento deixar de apenas ser uma escalada para as figuras centristas democratas.

Com o anuncio de Warren, uma carismática líder e firme defensora da regulamentação dos grandes bancos e corporações; e com as andanças de Sanders ao redor dos Estados Unidos, levando sua mensagem progressiva aos estados do meio-oeste e do sul, e aos tradicionais estados republicanos da região montanhosa, com o intuito de alcançar eleitores fora dos grandes centros liberais, os progressistas iniciam uma jornada política que podem lhes dar a indicação democrata no ano vindouro. Num momento em que a base do partido se alinha mais aos valores progressistas do que aos valores centristas neoliberais, o movimento tem a chance única, em décadas, de voltar a ter o controle político democrata.

Apesar de energizar os eleitores progressistas, o movimento precisa ficar atento e tomar cuidado caso mais de duas candidaturas da ala venham a querer a indicação presidencial. Há espaço para duas candidaturas competitivas, mas com três, o movimento terá que dividir os votos entre si, abrindo caminho para uma nomeação do nome ungido do establishment democrata.

É altamente provável que o establishment democrata escolha apenas um nome para ser seu candidato, até aqui o nome mais forte é do ex vice-presidente Joe Biden, que apesar de contar com boas credenciais perante a base eleitoral da legenda, estará com 78 anos em 2020, o que levanta dúvidas se sua idade será um fator de peso na escolha do establishment. Biden foi um vice discreto, com bons índices de popularidade, que agiu politicamente bem nos momentos adequados.

No entanto, a idade vem sendo um fator que pesa contra o provável candidato. Não só a Biden, como também a Sanders. As lideranças democratas estão envelhecidas, o que se torna um problema na medida em que o partido precisa passar por uma renovação geracional de seus líderes, e quem está à frente nesse quesito é exatamente a ala progressista. O movimento conta com a ascensão de Alexandria Ocasio-Cortez, deputada pelo estado Nova York, com a ascensão de Beto O’Rourke, que mesmo derrotado por Ted Cruz na disputa pelo Senado do Texas, fez com que o partido tivesse em disputas estaduais executivas pouco mais de 48% dos votos, algo que não acontecia desde meados da década de 90 no estado.

Além de Ocasio-Cortez e O’Rourke, ainda há Cory Booker, senador pelo estado de Nova Jersey, a própria Kamala Harris, e outros tantos políticos. Os quadros estabelecidos e em ascensão do movimento progressista democrata são jovens, com uma média de idade bem abaixo dos 50 anos, e são as lideranças que mais vem protagonizando os debates em torno da direção que o partido deve tomar.

Com o envelhecimento dos quadros do establishment, e derrotas dos democratas moderados no ciclo eleitoral de 2018, inicia-se uma progressiva emergência dos nomes da ala progressista, que caso venham a vencer as primárias presidencial democrata, iniciarão o segundo semestre de 2020 em vantagem.

Não pertence tão somente aos democratas, fissuras políticas internas, o GOP (partido republicano), está no mesmo ritmo. É interessante como neste momento histórico, democratas e republicanos vivem crises de identidade e liderança. Donald Trump começa seu 3º ano de governo com uma paralisação parcial dos serviços federais, que já é a mais longeva desde 1998, quando Bill Clinton se via encurralado pelas notícias que vinham à tona sobre o caso extraconjugal com Monica Lewinsky. Mas Clinton era um presidente minimamente sensato, e que ainda tinha sua esposa Hillary para fazer com que o governo voltasse aos eixos.

Já Trump não é um líder, e é um inapto comandante em chefe. O presidente sinalizou que a paralisação do governo federal pode durar dias, até mesmo meses ou anos. O motivo da não aprovação para o orçamento federal até aqui se refere ao muro que Donald quer erguer na fronteira com o México. Promessa de campanha, que Trump vociferava que seriam os mexicanos responsáveis por pagar pelo muro, um delírio e tanto, o muro é a carta na manga de Donald para energizar sua base política, num momento delicadíssimo do presidente, quando o GOP perde o controle da Câmara dos Deputados, e a popularidade de Trump está levemente mais baixa que nos últimos dias, o que faz do presidente o mais impopular em décadas nesse momento histórico de ciclo de mandato.

Trump, neste exato momento, se torna uma figura que mantém coesa a base republicana, mas está com uma aprovação abaixo de 40% entre os independentes, percentual crítico entre eleitores que representam quase um terço da composição do eleitorado americano, e são quem decidem eleições.  

A insistência de Trump com o muro, as turbulências econômicas advindas dessa instabilidade político-administrativa, juntamente com uma aguda crise de consenso entre o establishment republicano e seus políticos moderados, causa no GOP uma crise política que nem mesmo Bush chegou a causar quando no momento que decidiu invadir o Iraque e iniciar a guerra no Afeganistão.

Trump age como agia Richard Nixon nos momentos finais que já demonstravam com precisão a derrota das tropas americanas na guerra do Vietnã, e nos momentos que vinham à tona o caso Watergate, e do começo do impeachment de Nixon. O comportamento de Nixon naquele momento histórico levou a cabo uma teoria inspirada no presidente, que fora denominada, ‘Teoria do Louco’. Tal teoria diz que um líder ou indivíduos em posição de comando, agem de modos imprevisíveis, tornando com que seus comportamentos não possam ser avaliados e, portanto, presumíveis de conhecimento.

É justamente desse modo que age Trump. O presidente está levando sua derrota nas eleições de meio de mandato presidencial às últimas consequências, fazendo com que até mesmo republicanos comecem a ventilar um provável apoio ao impeachment do presidente. Porque, o instante que Trump se tornaria uma figura divisava dentro das hóstias republicana, chegou. E para as lideranças tradicionais do partido, é melhor se livrar do presidente agora, antes que o mandatário se torne tóxico de vez para o partido nas eleições presidencial e estadual de 2020.

Há chances reais dos democratas vencerem disputas para o Senado em uma dezena de estados, caso tenham candidatos competitivos para tanto, e com isso, retomarem o controle do Senado Federal. Mas para tal objetivo ser realizável, é necessário que Trump siga na Presidência. Um possível conluio entre republicanos e democratas para abrir um impeachment de Trump favorece justamente o presidente, que precisa de um fato atípico para mealhar alguma favorabilidade na opinião pública.

Trump demonstra um alto desgaste do seu mandato, mas não se deve subestimar sua capacidade de embaralhar o jogo e obter vitória, foi isso que ele fez em 2016, e é isso que ainda pode fazer caso um impeachment seja aberto. A bem da verdade, tudo indica que o presidente está querendo exatamente uma abertura de impeachment, como última cartada para se manter no poder. É loucura. Nixon usou a tática do louco e caiu. Mas Nixon era um político tradicional, experimentado com os mandatos de deputado federal, senador e vice-presidente. Já Trump é o oposto disso, e nada tem a perder.

É bem verdade que se surgirem provas convincentes de supostas relações entre assessores de Donald em conluio com burocratas russo para interferir na campanha presidencial de 2016, como as investigações correm, Trump acabe por não conseguir se safar, e sofra um impeachment. Mas, a habilidade do presidente de virar a mesa e conseguir se safar já foi testada, e convém não ser subestimada.

O perigo não é para Trump e nem para os republicanos, que se encontraram enfraquecidos e com previsões de perderem em 2020. O perigo é para os democratas, que controlam a Câmara dos Deputados, portanto, tem agora responsabilidade administrativa, e goza de números convincentes para vencerem no ano que vem. Os democratas precisam estarem atentos e agirem com bastante cautela. Trump não é um jogador qualquer, e as lideranças do GOP sabem que se livrar do presidente é bom para o partido.

O GOP está ameaçado de perder um bom número de assentos no Senado em 2020, e Trump continuar na Presidência é um fardo político-eleitoral para o partido. Se os democratas não souberem dosar os próximos passos que devem tomar adiante, correm o risco de sofrerem um revés. Se Trump cai, assume o vice Mike Pence, político ultraconservador pertencente ao establishment do partido, tudo que os republicanos desejam para conseguirem credibilidade presidencial até meados do ano que vem, e ver se conseguem salvar a própria pele nas eleições.

Nancy Pelosi, líder da Câmara dos Deputados, Chuck Schumer, líder da minoria democrata no Senado, Jay Inslee, líder dos governadores democratas, bem como as lideranças do movimento progressivo, devem ficar em alerta. Ao menor passo em falso no intricado jogo que Donald Trump iniciou, podem acabar presenteando o impopular, mas ainda com chances de se salvar, presidente.

Trump não tem absolutamente nada a perder, como tinha muito a perder Richard Nixon em 1974. Os republicanos com a saída de Donald tendem a melhorar o índice eleitoral do partido com a opinião pública. Já os democratas têm um bom ativo eleitoral a perderem. É assim que o tabuleiro eleitoral de 2019 começa. E só para lembrar, 2020 está logo ali, não demorará a chegar.

(*) João Paulo Jales dos Santos. Estudante do curso de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).

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AUTOR

César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.

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