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Postado às 10h45 | 20 Jan 2019 | João Paulo: 'Coalizações presidenciais eleitoral-regionais'

Crédito da foto: Reprodução Eleições no Brasil

(*) João Paulo Jales dos Santos

Analisar votações eleitorais no Brasil, é um trabalho feito por poucos pesquisadores, e que acaba não tendo muita publicização dentro do âmbito acadêmico. Via de regra, são estrategistas político-partidários e marqueteiros, que possuem mais noção de dados e estatísticas eleitorais. A análise que será feita no presente artigo recai numa perspectiva quantitativa. Para se ter maior compreensão sobre as dinâmicas estaduais e regionais de votações, estudos quali-quanti são mais apropriados para efeito. De todo modo, o esforço de se analisar dados quantitativos, já é um primeiro passo, para se entender coalizações regionais eleitorais desde a eleição de 1989. A partir da presidencial de 2006, os polos políticos da esquerda e da direita, apresentam melhor grau de discernimento nas votações nos estados.

Em 1989, Collor dominou geograficamente o mapa eleitoral, no entanto, sua votação teve o maior peso das zonas rurais e das cidades de médio porte, com Lula dominante nos grandes centros urbanos. Na votação popular, Collor venceu Lula com uma equilibrada diferença de 6,06% dos votos. Nas eleições de 1994 e 1998, com a popularidade do plano real recaindo sob Fernando Henrique Cardoso, FHC venceu Lula em sua 1ª eleição com uma diferença de quase 30% dos votos, e com pouco mais de 21%, na segunda. Os pleitos de 1994 e 1998 foram os únicos conquistados em 1º turno desde a redemocratização.

Em 2002, numa eleição sob o lastro da crise econômica do 2º mandato de FHC, Lula derrotou Serra com pouco mais de 61% dos votos, não pintando todo o mapa de vermelho, porque perdera em Alagoas. Estado este que desde 2006, se tornou confiável território petista, mesmo Dilma tendo vencendo Serra em 2010 numa votação relativamente equilibrada. Os pleitos de 2002 e 2018, transcorreram sob um ambiente de crise econômica e social, que acabaram por torna-los atípicos. 2002, porque Lula venceu em praticamente todos os estados que perdera para Collor e FHC. E 2018, porque mesmo a força opositora, representada na candidatura de Fernando Haddad, tendo vencido em 11 estados, perdeu no Amapá, Amazonas, Minas Gerais e Rio de Janeiro, estados convencionalmente petistas.

Observa-se, que em momentos de crise, a eleição se dá favoravelmente a candidatura opositora, como em 2002 e 2018, nesta, mesmo o PT não estando mais no poder, o olhar popular viu em Bolsonaro a oposição não só ao partido, mais também, ao tradicionalismo político. Em momentos de uma economia equilibrada, a eleição acaba por beneficiar, com altas votações, a candidatura governista, como em 1994, 1998, 2006, e em menor intensidade, em 2010.

Em 2014, num panorama social atípico, consequência das manifestações de junho de 2013, que mexeram com o humor do eleitorado, o custo da reeleição de Dilma se deu em cima de uma votação mais apertada, a menor diferença desde a redemocratização. Mesmo Lula tendo sido reeleito com quase 61% dos votos, margem parecida com sua vitória em 2002, a reeleição do líder petista se deu com uma perda de 7 estados, quando se compara com sua 1ª vitória. Ali, em 2006, iniciava-se, progressivamente, o que ocorreria 8 anos depois, na eleição de 2014. O mapa eleitoral da votação do 1º turno de 2006, é o mesmo da votação do 2º turno de 2014.  E se em 2002, Lula venceu Serra em todas as 5 regiões, em 2006, perde no Sul, que nos pleitos seguintes viria a se tornar a região mais opositora ao petismo. Importante assinalar, que quando enfrentou Lula, a maior votação de Gerado Alckmin se deu no extremo norte do país, em Roraima.

No lastro do escândalo do mensalão, e com a pujança dos programas sociais, o PT perde relativa popularidade na classe média, compensada com substancial apoio entre os excluídos e a classe baixa, representantes da maior parcela do eleitorado, onde o partido sempre esteve presente com os movimentos populares de base, principalmente no Sudeste, e em menor escala no Nordeste, Sul e Distrito Federal, angariando o apoio eleitoral dos mais pobres em eleições intercalares, até o partido chegar ao Palácio do Planalto, momento que atrelou de modo significativo a votação das classes populares a agremiação.     

2010 foi a última vez que o PT venceu no Distrito Federal, como também fora a última vez que o partido venceu no Sudeste. No panorama político-eleitoral de 2014, com o debate se dando fortemente na questão social, Dilma mantém a liderança petista em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, mas vê sua votação ser reduzida em quase todas as unidades federativas, quando se compara com sua 1ª eleição. Acre, Espírito Santo, Rondônia e Goiás, em 2006, votaram em Lula, mas posteriormente, premiaram nas urnas, a oposição.

Em 2010, no 1º turno, Dilma venceu no Rio Grande do Sul, em Goiás e no Espírito Santo, mas perdeu, com pouca diferença, para Serra, no 2º turno. Estreando na política, Dilma venceu no Amazonas com pouco mais de 80% dos votos. E veio do Acre e de Roraima, as duas maiores votações de Serra, com o tucano derrotando Dilma nos 2 estados com mais de dois terços dos votos. Se o pensamento convencional costuma dizer que a força política da oposição, geralmente, se encontra nos maiores estados e nos grandes centros urbanos, desde 2006, no caso de Roraima, e desde 2010, no caso Acre, a oposição vem vencendo com largas margens, nesses estados pouco urbanizados, e economicamente mais fracos.

Em 2018, um dos problemas para a derrota de Fernando Haddad, foi que além de perder dois grandes colégios que estavam há eleições seguidas sob a órbita de influência do PT, Minas e Rio, o petista, teve menos de um terço dos votos em 8, dos 16 estados vencidos por Bolsonaro, numa situação não ocorrida com Dilma em 2014, nos estados pró-Aécio.    

Em 2010, o PT perdeu para o antipetismo por margens relativas e pequenas no Rio Grande do Sul, tradicional praça do partido até 2002, no Espírito Santo, em Goiás, Mato Grosso do Sul e Rondônia. Com a deterioração na imagem da agremiação, a balança, nesses 5 estados, pendeu de sobremodo para o antipetismo nas duas eleições seguintes. Assinala-se, que o petismo, perdeu, num hiato de 16 anos, o apoio de mais de 20% dos votos no maior colégio eleitoral do país, São Paulo.

Se de 1989 até 2002, os centros urbanos populosos eram os responsáveis por creditarem mais votos ao PT, a lógica eleitoral dos últimos anos se inverteu. Enquanto em 2010, Dilma venceu nas 26 capitais estaduais, Aécio conseguiu tal êxito em 2014. O voto petista, se deslocou fortemente das zonas urbanizadas para as ruralizadas. Haddad, teve quase 45% dos votos, porque concentrou sua votação basicamente no Nordeste, que se somou aos esparsos apoios que vieram das cidades e das relativas boas margens que o petista teve nos interiores país afora. Como em 2018, o antipetismo saiu das mãos do PSDB e foi para o comando da extrema direita, a deterioração eleitoral que Dilma teve há 4 anos, se aprofundou em 2018, com Bolsonaro tomando o lugar eleitoral, em muitas zonas eleitorais, que fora de Lula há quase 30 anos.

Quais as dinâmicas eleitorais que explicam qualitativamente os reflexos das votações? A pergunta é de fundamental importância para se compreender do por que que no decorrer de quase 30 anos, a geografia do voto mudou drasticamente no tecido social brasileiro. O antipetismo ganhou mais força há 5 anos nas regiões, Sul e Centro-oeste, com economias fortemente agrícola. E estando no Sul, considerável parcela da classe média do país, com a do Rio Grande do Sul por anos se identificando com a esquerda, que em 2006, juntamente com outros estratos médios sulistas, rompeu a aliança político-eleitoral com o PT. No Norte, região com o maior número proporcional de evangélicos, o antipetismo conseguiu uma vitória que não vinha há 16 anos.

O Nordeste, substancialmente governista em seu histórico de registro eleitoral, se tornou a região mais fidelizada da coalização eleitoral de centro-esquerda, bastião que outrora, no Nordeste, pertencia a oposição. O Sudeste, muito vinculado as forças opositoras, progressivamente, passou a dar mais apoio a oposição, enquanto o PT estava no poder. Rio e Minas, se mantiveram petistas até virarem o voto para Bolsonaro. Já São Paulo, desde 2006, passou a ser um dos maiores centros de oposição ao lulopetismo.

Os paulistas, reclamam do tempo que o PT estava no comando do governo central, período que compreendeu 14 anos, mas há 24 anos elegem governadores tucanos. Fato que tende a explicar a lógica paulista de ter se transformado num polo de combate ao PT. Com Doria, o tucanato chegará a completar, em 2022, 28 anos à frente do Palácio dos Bandeirantes, maior tempo que um partido passará no comando de um estado desde a volta direta da escolha dos governadores, via sufrágio, em 1982. Mas os tucanos estão dentro da máquina burocrática do governo estadual desde que Franco Montoro fora eleito em 1982.

Da década de 80 para cá, não há nenhum agrupamento político regional que tenha passado tanto tempo fazendo parte de uma gestão estadual. Há ainda uma curiosidade, vinda do Mato Grosso do Sul, importante centro econômico do agronegócio, que em 1998 e 2002, elegeu Zeca do PT governador do estado, figura tradicional da esquerda do Centro-oeste, num colégio eleitoral robustamente atrelado ao tradicionalismo direitista.

Economia, demografia, classe, políticas públicas, cultura sócio-política, sentimento de prosperidade, indicadores sociais, espaço territorial, podem ser variáveis explicativas de dinâmicas da geografia do voto. Os resultados eleitorais presidenciais nas 8 eleições realizadas desde a redemocratização, são reflexos de fundamentos de variáveis políticas e sociais. As mudanças no comportamento eleitoral nessas quase 3 décadas, requerem maior embasamento qualitativo, os tendo, fica mais fácil de se compreender do por que que o petismo e o antipetismo, ao decorrer do tempo, mudaram as forças constituintes de seus respectivos polos político-eleitorais.

(*) João Paulo Jales dos Santos. Estudante do curso de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).

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César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.

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