Por César Santos – Da Redação
A Enfermaria Clínica Pediátrica e o Pronto Socorro do Hospital Regional Tarcísio Maia (HRTM) não têm nenhuma condição para prestar serviço de atendimento à população diante do cenário imposto pela pandemia do novo coronavírus. Está faltando tudo, de estrutura física à material básico. O cenário é mais grave do que o que já hava sido revelado pela imprensa.
O JORNAL DE FATO teve acesso a um documento encaminhado ao Secretário de Estado de Saúde Pública do Rio Grande do Norte, Cipriano Maia, em que profissionais desses setores relatam o caos. Trata-se do ofício 001/2020, assinado pela representante dos médicos pediátricos atuantes no HRTM, Maria Targino Bezerra Alves, e pelo coordenador do Pronto-Socorro Infantil, Gledson Emanuel de Oliveira Cavalcante.
O documento narra o caos dividido por carências de insumos, de recursos humanos, estrutural, de exames e medicamentos e carência de organização da própria Secretaria de Saúde do Estado.
No primeiro ponto, o de carência de insumos, o documento lista mais de três dezenas de itens que o hospital não dispõem, com ênfase para kits específicos para intubação em pacientes com coronavírus. São necessários em cada kit, segundo os profissionais: laringoscópio - lâmina curva ou reta; tubo orotraqueal com cuff; seringa para inflar o cuff; material para fixar o cuff; filtro HME adequado para idade/peso; drogas do SRI; máscara laríngea; e sonda estéril para aspiração + circuito aspirador ligado ao vácuo.
O ofício cita que foi solicitada à coordenação do HRTM, no dia 25 de março, a previsão de insumos básicos para o funcionamento dos setores de pediatria, mas até esta quinta-feira, 9, não havia recebido resposta ou entrega do material, “o que corrobora para o risco de vida das crianças expostas a esse serviço, já que dentre os insumos ausentes estão materiais essenciais para suplementação de oxigênio e também para a intubação.”
Os profissionais denunciam que não houve por parte da Sesap-RN a oferta de equipamentos de proteção individual (EPIs) para os funcionários do Tarcísio Maia, sendo que os equipamentos existentes foram doados pela sociedade civil organizadas, através de campanhas, e mesmo assim não é suficiente para atender a demanda.
RECURSOS HUMANOS
Segundo o documento, há um déficit preocupante de profissionais no HRTM. “No Pronto-Socorro Infantil há apenas um médico pediatra de plantão, inviabilizando o plano nacional de enfrentamento ao Covid-19, que orienta a disposição de profissionais diferentes para atendimento de criança suspeitas de Covid-19 e crianças não suspeitas”, denuncia, para afirmar que são necessários pelo menos dois médicos pediatras plantonistas para que não haja exposição das crianças não infectadas pelo novo coronavírus.
No PSI, relata o ofício, existem apenas um técnico de enfermagem, que é insuficiente para atender a demanda do Covid-19. Também não há profissional de enfermagem fixo na clínica pediátrica, uma vez que o único enfermeiro presta serviços em outros hospitais.
Também não há fisioterapeuta escalado para a pediatria. “Estamos diante de uma comorbidade onde a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SDRA) é a principal responsável pelo internamento dos pacientes, portanto, precisamos dispor de um fisioterapeuta em nossa escala para ofertamos um tratamento respiratório completo e adequado para tais pacientes”, ressalta o documento.
O relatório é apoiado por pediatras atuantes no Tarcísio Maia citados no ofício: Cinthya Cibelly Martins, Daniela Pereira Maia, Emanuel Marcela Luz, Francisco Sidione, Leandro Michel, Paulo Diogo de Oliveira, Priscila Michele Santos, Vitória Régia Pereira e Watson Peixoto Costa.
Hospital não tem sequer sala de emergência na pediatria
A carência estrutural é outro problema bem grave no Hospital Tarcísio Maia, segundo relata o ofício encaminhado ao secretário Cipriano Maia. O hospital, que é maior do interior do RN para urgência e emergência, não dispõe de sala de isolamento para a alocação de crianças com suspeitas ou confirmação de infecção por Covid-19. Essas são colocadas juntamente às outras crianças, comprometendo a sua saúde devido à exposição.
O documento denuncia que não há setor de semi-intesiva, sala de emergência (sala vermelha), nem UTI pediátrica, “o que impõe riscos de desfecho negativo a vida das crianças que venham a evoluir com piora em seu quadro clínico, necessitando de suporte intensivo ou qualquer procedimento de emergência.”
O Tarcísio Maia também não dispõe de desfibrilador pediátrico, ventiladores e monitores, que são itens essenciais para prestação de serviço adequado às crianças em estado grave ou crítico. Os profissionais relatam, no documento, que solicitaram à coordenação do hospital o conserto dos pontos de oxigênio e de ar comprimido da pediatria, pois a sua maioria encontra-se sem funcionamento, mas até agora não foi feito nada.
“É inadmissível que diante de uma pandemia por vírus cujo principal desfecho negativo é a SDRA não tenhamos à disposição materiais básicos, nem estrutura para a suplementação adequada de oxigênio”, relata.
Faltam exames essenciais para avaliação de pacientes
O ofício denuncia que o Hospital Tarcísio Maia não dispõe de exames essenciais para avaliação do quadro clínico dos pacientes, como coagulograma, gasometria e eletrólitos. Faltam antibióticos e outros medicamentos necessários para o suporte hospitalar.
“Necessitamos também de medicamentos para Sequência Rápida de Intubação (cetamina, midazolam, atropina e rocurônio) e Aerolin spray, uma vez que não pode utilizar a via de nebulização no cenário do novo coronavírus.
Por fim, o documento relata a superlotação no hospital público, onde falta de tudo, e diante de uma cenário de pandemia a situação torna-se ainda mais grave. “Deixamos aqui o nosso repúdio à imposição de referenciamento quando não foi oferecido pela Sesap nenhum suporte para isso. Aglomerar pacientes sem salas de isolamento, sem nenhum preparo físico, adoecerá pacientes não contaminados, médicos, enfermeiros e outros servidores”, conclui o documento.
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César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.