A implantação do novo piso salarial dos professores do ensino básico, com 33,24% de reajuste, conforme anunciado esta semana pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), é mais do que obrigação, é lei. Para a presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mossoró (SINDISERPUM), Eliete Vieira, o que se espera agora é que os gestores municipais e estaduais cumpram o dever. A entidade espera que o prefeito Allyson Bezerra (Solidariedade) envie o projeto à Câmara de Vereadores o mais rápido possível e que implante o novo piso retroativo ao mês de janeiro.
É sobre este e outros temas que a sindicalista abordou no “Cafezinho com César Santos”, na sede do JORNAL DE FATO. Eliete fez duras críticas à atual gestão municipal e cobrou do prefeito Allyson promessas de campanha como a implantação da gestão democrática nas escolas municipais, com eleição direta para diretores e vice-diretores.
O novo piso salarial dos professores foi anunciado na quinta-feira, 27, pelo presidente Bolsonaro, com 33,24% de reajuste. Não há uma certeza de que a Prefeitura de Mossoró cumpra o novo piso. Como o sindicato vai se posicionar nesse momento?
Não há mais nenhum argumento para que nenhum gestor em nível de estado e município se negue a cumprir a Lei do Piso do Magistério. O que se espera agora da gestão municipal é a agilidade em enviar a lei para a Câmara de Vereadores para ser aprovada o mais rápido possível, tendo em vista que o novo piso deve ser cumprido a partir deste mês de janeiro. É bom destacar que não havia impedimento à implantação do novo piso, porque se trata de lei, de matéria constitucional. O que houve foi uma mera formalidade do Ministério da Educação de questionar a legalidade. A lei define claramente quais são os mecanismos de reajuste do piso dos professores. A Lei do novo Fundeb, aprovada em 2021, apenas transforma o Fundeb permanente. Como presidente Bolsonaro não aguentou a pressão das instituições a nível nacional, determinou o novo piso salarial, e agora cabe ao prefeito de Mossoró cumprir o seu dever, que é encaminhar o projeto à Câmara para implantar os novos valores.
Os gestores municipais de todo o País, por meio da Confederação Nacional dos Municípios, têm afirmado que as prefeituras não têm condições de cumprir um novo piso. Em Mossoró, esse argumento deve ganhar força. Como o sindicato vê esse contraponto ao novo piso?
A gente sabe que o novo Fundeb já repassou quase 10 milhões de reais agora em janeiro, então, o município tem as condições de cumprir o reajuste do piso dos professores, somos conscientes que é possível.
O sindicato protocolou pedido de audiência com o prefeito Allyson no dia 15 de dezembro de 2021, justamente para discutir a questão do novo piso salarial. Houve alguma resposta, o prefeito marcou audiência?
Infelizmente, não. Desde dezembro que estamos em processo de organização da nossa luta, inclusive, nesta semana, protocolamos mais um ofício na Prefeitura. Já solicitamos audiências para a educação, saúde e assistência social, as nossas pautas precisam ser discutidas com a gestão municipal, mas infelizmente não rebemos nenhum retorno. Estamos abertos ao diálogo. Esse é o momento de dialogar. No ano passado, tivemos algumas conversas com a presença do prefeito Allyson, mas essas conversas, infelizmente, não se concretizaram em ações que diluíssem a demanda e resgatassem o respeito aos servidores públicos, no que diz respeito aos planos de cargo e carreira e outras demandas represadas. Desde julho do ano passado que a gente envia ofício à Prefeitura solicitando novas audiências para discutir nossas demandas, mas infelizmente, como diz o ditado, eles estão usando ouvido de mercador.
A gestão municipal vai encaminhar à Câmara projeto de lei que aumenta de 11% para 14% a contribuição previdenciária do servidor público. O sindicato vai se opor à reforma na previdência municipal?
Nós nos posicionamos contra a reforma da previdência em nível nacional e estadual. A governadora do RN (Fátima Bezerra) dialogou bastante com os sindicatos de todas as categorias, mesmo assim, mantivemos posição contrária à reforma da previdência estadual. O que acontece é que o gestor sempre tem que fazer reformas e transfere para que os trabalhadores, de uma forma geral, paguem as despesas ocasionadas. Não vamos aceitar que essa reforma aconteça sem que haja o diálogo. Ademais, o prefeito de Mossoró sugerir uma reforma na previdência é incoerência da parte dele.
Como assim?
Allyson, quando era deputado estadual, atacou a governadora durante o processo da reforma da previdência estadual, inclusive, ele foi um dos dois deputados que votaram contra o projeto em plenário (o outro foi o deputado cassado Sandro Pimentel). Ele dizia que jamais ficaria contra o servidor, contra o trabalhador. Agora, enquanto prefeito, pretende fazer uma reforma e, até aqui, sequer abriu diálogo com os maiores atingidos que são os servidores públicos. Então, apesar de não acreditar muito, a gente espera que o prefeito chame o sindicato para dialogar, para a gente ver onde é que é necessário fazer adequação à previdência, como disse o presidente do Previ (advogado Paulo Linhares).
O Sindiserpum já tem um posicionamento claro sobre a previdência?
Temos alguns questionamentos. Por exemplo, os pensionistas quem paga é a gestão e isso não é o previsto em lei. É preciso fazer um ajuste? Converse com o sindicato, porque na prática é Prefeitura que precisa legalizar. Se tem alguns erros na lei atual, converse com o sindicato agora. O que não pode é castigar ainda mais o servidor público. Estamos há cinco anos sem reajuste salarial e aí, com essa proposta de aumentar a alíquota da previdência, vai agravar cada vez mais a defasagem dos salários dos servidores. A prioridade do prefeito deveria ser cumprir com o discurso de campanha, com promessa de valorização do servidor, reajustar os salários, respeitar o plano de cargo e carreira, mas, infelizmente, o que ele está querendo é agravar o arrocho, aumentando a alíquota previdenciária.
Há um levantamento feito pelo próprio Sindiserpum que aponta que o salário-base do servidor público está cada vez mais inferior ao salário mínimo nacional. Como é que o sindicato pretende reverter essa situação?
Isso é uma preocupação muito grande porque temos cada vez mais servidores com salário-base inferior ao piso nacional de salários. O Sindiserpum entrou com uma ação para que a tabela da lei 03 fosse respeitada. O salário inicial da tabela é o salário mínimo, a data-base a nível nacional de reajuste era maio e, a partir do governo Lula, foi antecipando o reajuste até que chegou a janeiro. Um dos pontos de pauta nossa de reivindicação, há muito tempo, é trazer a data-base dos servidores públicos de Mossoró para janeiro. Essa defasagem nos salários é ocasionada pelo seguinte: há o reajuste do salário mínimo em janeiro, as gestões não corrigem, aí quando chega maio, que é a nossa data-base, dão o reajuste e não fazem a correção desde o início da tabela. A consequência é o achatamento salarial e, com isso, temos um número considerável de servidores com salário-base abaixo do mínimo. Entenda-se que não é a remuneração; é o salário-base. Temos aí a desvalorização e o desrespeito ao plano de cargos e carreira, mas, estamos reagindo, inclusive ganhamos ações na justiça e estamos individualizando.
Não há uma sinalização da gestão municipal para resgatar o valor do salário-base?
Estamos buscando o diálogo para ver se o prefeito apresenta proposta de resgate do poder aquisitivo, mas, enquanto essa proposta não é discutida, ações do sindicato permanecem.
O prefeito Allyson Bezerra recebeu o sindicato nos primeiros dias de gestão, em janeiro de 2021, e afirmou que a sua gestão iria dialogar e ouvir os servidores permanentemente. Isso está acontecendo?
Infelizmente, não. Não existe diálogo. Curioso que conversei com um profissional de imprensa recentemente e ele falou uma coisa que é verdade: a atual gestão tem tirado até o direito de a imprensa fazer um furo de reportagem, porque primeiro se faz os vídeos com o prefeito e coloca na mídia. Isso é muito ruim, porque é uma forma de a gestão municipal tentar nos calarem, temos diversos atos que comprovam isso. A gente acreditou que seria possível que houvesse de fato o diálogo. Como disse já aqui, no começo da gestão de Allyson a gente conversou diversas vezes, mas, infelizmente, não se concretizou na prática.
E como o sindicato vai se movimentar para conseguir dialogar com a gestão municipal?
A gente não pode começar a campanha salarial de 2022 já armado, falando de fazer uma greve. Nós vamos apresentar as reivindicações, buscar o diálogo, dar um tempo para que haja resposta da gestão. Agora, o servidor tá cansado de esperar. Então, é importante que a gestão busque apresentar respostas. Nós temos várias demandas que são urgentes. Temos o piso dos agentes de combate às endemias e agentes comunitários de saúde, que é pra ser ajustado também no mês de janeiro, mas a lei ainda não foi encaminhada à Câmara; temos o reajuste do piso dos professores; e temos também o reajuste salarial de todos os servidores, que estão há muitos anos sem resposta e com plano de cargos e carreira desrespeitado. Nossa primeira ação é conversar, ver o que os servidores estão esperando e apresentar as reivindicações para a gestão, aguardar retorno. Se houver indiferença, a gente vai definir com os servidores as estratégias de luta, de mobilização.
Na proposta de governo apresentada na campanha de 2020, Allyson prometeu a profissionalização da máquina pública, a eficiência do serviço que é direito do cidadão e a impessoalidade da gestão. É possível dizer que há sinais nesse sentido?
Não. A promessa foi esquecida. É impossível falar sobre impessoalidade na atual gestão, tendo em vista a forma midiática como o próprio prefeito se apresenta. Antes, se fazia uma reunião, convocava a imprensa para fazer o anúncio do que era definido. Hoje, a vacina que o gestor toma vira um vídeo nas redes sociais; uma visita que o prefeito faz à UPA é exposta de forma midiática. Essa é uma postura de quem está em eterna campanha eleitoral. Ele tem que entender que não é mais candidato, é o prefeito que precisa governar Mossoró. A gente lamenta que na atual gestão, o pessoal procura se destacar mais do que a função de prefeito.
As denúncias recorrentes de perseguição ao servidor público, seja efetivo ou comissionado, preocupa ao sindicato? Há um posicionamento da entidade em relação a essas denúncias?
A gente deixa claro qual é o papel do dirigente sindical, que é exatamente assumir a luta em defesa das categorias. O que o dirigente sindical faz depois da porta do sindicato, que é a vida pessoal dele, diz única e exclusivamente a ele. A mesma coisa se aplica ao servidor. Durante uma campanha eleitoral, o servidor tem o direito democrático de fazer a sua opção, votar em quem ele quiser. Passada a campanha eleitoral, o servidor tem a obrigação de cumprir o seu papel de servir bem a população. Na atual gestão municipal, o servidor está silenciado, não pode falar nada. Se ele contestar qualquer ordem, que não seja da competência dele de servir, é ameaçado por superiores.
Que tipo de ameaça?
Há caso de servidor postar em suas redes sociais fotos com ex-candidato ou ex-gestor e esse servidor ser comunicado para remover a foto sob pena de sofrer perseguição. Se um servidor reclamar a falta de luvas para fazer um procedimento, se ele solicita uma pinça para tirar ponto do paciente, se solicita uma pilha para utilizar em determinado aparelho, ele é convocado a comparecer na Secretaria de Saúde para receber ultimato do tipo: “nós estamos dando a você a última chance.” Isso é um absurdo porque o servidor está reivindicando apenas condições de trabalho para melhor atender a população. Ele não pode ser encaminhado para o RH da saúde para receber a última chance e ouvir ameaças como ‘você vai ser demitido’. Não podemos e não vamos aceitar isso, o servidor é pontual, é competente, prima pela preservação da saúde e deve ser respeitado por todos.
Têm fatos concretos, presidente?
Há casos de servidor ameaçado de ser removido para um lugar onde eles não façam mais jus ao PMAQ (programa de valorização dos servidores da Saúde) e, com isso, sofra uma redução de mais de 600 reais na sua remuneração. O Sindiserpum não aceita isso, até porque existem critérios para um servidor ser removido.
Presidente, na campanha eleitoral de 2020 todos os candidatos prometeram a implantação da gestão democrática nas escolas municipais. Foi, inclusive, uma das principais propostas de Allyson Bezerra para a Educação. Há algum processo nesse sentido?
A gente ficou surpreso quando começamos a cobrar o projeto de gestão democrática nas escolas, porque percebemos que não havia interesse do governo. A gente esperava que o prefeito encaminhasse projeto à Câmara, mas ele não o fez. Inclusive, durante audiência no Ministério Público a Secretaria de Educação (professora Hubeônia Alencar) não mostrou interesse pela gestão democrática e chegou a afirmar que a proposta, prometida pelo prefeito, era para um mandato e não para imediatamente. Ficamos surpresos ao ouvir da gestão que a eleição democrática não era propriamente o modelo ideal e que muitas vezes poderia trazer maior complicação. Isso nos preocupa porque falta coerência ao atual prefeito. Na campanha, ele criou expectativas positivas ao prometer implantar a gestão democrática na rede municipal e agora essas expectativas estão frustradas. A gente espera que essa frustração não permaneça e que o prefeito possa, neste ano, encaminhar o projeto à Câmara para resgatar a palavra e realizar o desejo dos professores e da comunidade escolar de uma forma geral.
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César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.