Surgiram novos fatos no caso do aditivo suspeito da reforma do Memorial da Resistência, que pode comprometer ainda mais o prefeito Allyson Bezerra (Solidariedade) e o presidente da Câmara Municipal de Mossoró, Lawrence Amorim (Solidariedade). O aditivo em discussão teve valor de quase meio milhão de reais, correspondente a 44,36% do valor original da reforma, e foi assinado após a obra pronta.
Um novo documento foi publicado no Jornal Oficial do Município (JOM), com data de 5 de julho, que prorroga o contrato com a empresa J. Z. R. Construções Ltda, responsável pela execução da obra, por mais 90 dias. A prorrogação acontece 34 dias após a assinatura do aditivo, feita em 1º de junho de 2022, e 33 dias após a inauguração da obra, realizada no dia 2 de junho de 2022.
Esse fato é narrado no relatório elaborado pela Comissão de Planejamento, Uso, Ocupação e Parcelamento do Solo, Obras e Serviços Públicos, da Câmara de Mossoró. O relatório observa que a prorrogação fora firmada em 23 de junho, todavia, aguardou-se diversas edições do JOM para sua publicação que somente ocorreu, justamente, quando da publicidade dos fatos e das suspeitas a respeito do aditivo de valor.
No entendimento da comissão, após a suspeita ser levada a público, com ampla divulgação, a gestão municipal vem tentando justificar o aditivo com elaboração e publicação de novos documentos. No entanto, as datas que constam nesses documentos reforçam as suspeitas que foram levantadas.
Doadores
O outro fato surgiu nesta segunda-feira, 11, quando o jornalista Bruno Barreto publicou em seu blog que os donos da empresa beneficiada pelo aditivo foram responsáveis pela doação de 10,7% da campanha de Lawrence Amorim em 2020. Trata-se de José Zélito Nunes, José Zélito Nunes Júnior e Romero Rego Nunes, sogro e cunhados do presidente da Câmara de Mossoró.
Barreto publicou os extratos (VEJA AQUI) comprovando que dos R$ 123.206,21 arrecadados pela campanha de Lawrence ao longo do processo eleitoral, um montante de R$ 13.200 foi doado pelos parentes donos da J. Z. R. Construções Ltda.
A empresa ganhou a obra do Memorial no valor de R$ 977.827,58, com assinatura de contrato no dia 30 de junho de 2021. Em 1º de junho de 2022, com a obra concluída e inauguração anunciada para o dia seguinte, a empresa foi beneficiada com o aditivo no valor de R$ 433.724,01, elevando o custo para mais de R$ 1,4 milhão, ou 44,36%.
O jornalista destaca na reportagem que Lawrence negou influência em relação ao aditivo e tentou forjar a versão de que a licitação teria sido ganha ainda na gestão passada, mas “a história não se sustenta porque a licitação foi concluída em maio de 2021 e o contrato assinado em 30 de junho, já na gestão de Allyson Bezerra.”
Relatório será entregue ao Ministério Público, TCU e TCE-RN
Membros de comissão apresentaram relatório nesta segunda-feira, 11
Membros de comissão apresentaram relatório nesta segunda-feira, 11O relatório da Comissão de Planejamento, Uso, Ocupação e Parcelamento do Solo, Obras e Serviços Públicos está distribuído em 13 páginas e um calhamaço de documentos anexado sobre a obra suspeita do Memorial da Resistência. Chama a atenção uma série de procedimentos suspeitos que foi encaminhado pela gestão municipal, após a vereadora Marleide Cunha (PT) ter denunciado o caso no plenário da Câmara Municipal de Mossoró.
Na página 8 do relatório, a comissão destaca que no dia 13 de junho de 2022, o diretor administrativo financeiro encaminhou memorando à Secretaria Municipal de Finanças informando da necessidade de proceder o aditivo no contrato original, com acrescimento de R$ 443.724,01, afirmando que a alteração seria justificada mediante necessidade de readequação da planilha técnica licitada, para garantir o andamento e a conclusão da obra. Informou que a referida necessidade seria amparada em justificativa técnica elaborada pelo setor competente da secretaria.
“Todavia, se torna estranha a solicitação de aditivo, considerando que na Solicitação de Nº 0657/2022, o secretário de finanças, sr. Edmilson Freire Júnior e o de infraestrutura, meio ambiente e urbanismo, Rodrigo Nelson Lima Rocha, solicitam que a Caixa Econômica Federal efetue o pagamento à contratada no importe de R$ 147.962,24 (cento e quarenta e sete mil, novecentos e sessenta e dois reais e vinte e quatro centavos). Nesta solicitação, a qual consta vislumbra-se que os próprios secretários informam que, em 1º de junho de 2022, há um saldo no empenho do contrato no valor de R$ 431.523,43.”
O relatório questiona:
“Se em 1º de junho de 2022 havia um saldo de empenho da ordem de quase 50% do valor total do contrato, o que justifica, neste mesmo dia (com a obra finalizada e inauguração iminente), a Prefeitura ter contratado um outro aditivo contratual que importaria no percentual de 44,36% do valor original contratado?”
“Não se pode alegar que neste saldo de empenho, já estivesse contemplado o valor referente ao aditivo contratual, posto que, como consta de dados do portal da transparência, o empenho referente ao aditivo possui o número 10060001/2022, com o valor de R$ 433.724,01 e foi emitido em 10 de junho de 2022, logo depreende-se que na Solicitação de Nº 0657/2022, os secretários de finanças e infraestrutura ao comunicarem o saldo de empenho contratual à Caixa Econômica Federal, não levaram em consideração o aditivo firmado, segundo o processo administrativo, naquele mesmo dia, tanto porque o valor é divergente, quanto porque o empenho referente ao aditivo somente fora emitido em 10 de junho de 2022.”
O relatório observa que “nos autos do aditivo contratual inexiste qualquer solicitação e/ou aceitação por parte da empresa contratada (J. Z. R. Construções Ltda), sendo os atos da solicitação e tramitação do aditivo processados todos a partir de dados e informações fornecidas pelos próprios agentes da administração.”
“Digno de nota, ainda, que o parecer jurídico exarado nos autos possui uma informação que, aparentemente, destoa do processo. Note-se que na parte da conclusão o parecerista fala em convalidação de atos administrativos. Entretanto, indaga-se quais seriam os atos objeto de convalidação se, a princípio, o processo administrativo referente ao aditivo contratual atenderia, formalmente, à regularidade?”
E ainda destaca: “Nota-se que após o parecer jurídico segue, imediatamente, o aditivo assinado, não havendo qualquer ato de aprovação ou de chancela do parecer jurídico, tampouco de ratificação do aditivo formulado após sua tramitação interna, o que, certamente, desatende ao usual.”
O documento, apresentado nesta segunda-feira, 11, tem assinatura do presidente da comissão, Isaac da Casca (MDB), vice-presidente Francisco Carlos (Avante) e da 2ª suplente Larissa Rosado (União Brasil). O relatório será encaminhado para o Ministério Público, Tribunal de Contas do Estado (TCE-RN) e Tribunal de Contas da União (TCU).
“Ao entregarmos o relatório para os órgãos citados, esperamos que eles façam uma análise ainda mais detalhada e apurada, pelo bem da transparência e da boa gestão e aplicação de dinheiro do povo mossoroense”, afirma o vereador Isaac da Casca.
O que a Prefeitura deve esclarecer sobre o aditivo da reforma do Memorial da Resistência
- Qual foi a imprevisão contratual que justificou o aditivo?
- Em qual momento da execução contratual esta imprevisão restou evidenciada?
- Quais itens estavam previstos no projeto original?
- Qual o objeto específico do contrato originário?
- O objeto do aditivo foi executado antes da assinatura ou ainda será?
- Como se chegou aos custos do aditivo?
- Quem elaborou os cálculos?
- Os recursos utilizados para pagamento são de natureza municipal ou federal?
- Há declaração de disponibilidade orçamentária para execução do aditivo?
- Houve necessidade de reforço do empenho para viabilizar o aditivo?
- Quem é o fiscal deste contrato?
- Quem atesta o recebimento das medições de obra neste contrato?
- Foi elaborada a planilha de medição da obra do Memorial?
- Qual o percentual da obra foi executado de junho a dezembro de 2021 e de janeiro a junho de 2022?
- Qual o percentual da obra falta ser executado?
- Quantas medições foram pagas referentes ao contrato como um todo?
- Foi realizado algum pagamento referente a esse aditivo? Quando? Qual o valor?
- Há atesto fiscal nas medições pagas?
- Qual a razão da demora na disponibilização do processo?
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César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.