No momento em que a gestão do prefeito Allyson Bezerra (Solidariedade) concentra os seus esforços para contratar um empréstimo de R$ 200 milhões junto à Caixa Econômica Federal (CEF), que vai comprometer as finanças do município pela próxima década, a saúde financeira pública de todo o país emite sinais de fragilidade, com impacto, principalmente nas contas dos municípios. Inclusive, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) emitiu recomendação para que os gestores tenham maior responsabilidade no trato com o dinheiro público.
O primeiro decêndio de abril do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) serve de alerta. O Tesouro Nacional fez o depósito na segunda-feira, 10, com uma queda nominal de 10,11% e 11,38%, quando considerada a inflação, na comparação com o mesmo período de 2022. Os valores que entraram nas contas das prefeituras somam R$ 5.411.600.475,19, já descontada a retenção do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
A Prefeitura de Mossoró, de coeficiente 4.0, teve no primeiro decêndio de abril o valor bruto de R$ 6.074.036,84. No ano passado, o repasse foi de R$ 6.757.235,40. Uma queda de quase R$ 700 mil só nesta parcela. Quando desconta os 20% do Fundeb, o valor líquido caiu para R$ 4.798.489,10.
Embora o repasse esteja em queda, a expectativa para o mês, de acordo com dados disponibilizados pela Secretaria do Tesouro Nacional, é de um crescimento de 12,6% em relação a abril de 2022. Porém, para esse resultado se concretizar, análise da CNM aponta que os dois próximos decêndios devem, juntos, apresentar um crescimento superior a 42%. No acumulado do ano, o FPM de 2023 está com crescimento real de apenas 3,28% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Além do FPM, outras receitas estão em queda na maioria dos municípios. Esse impacto é sentido de maneira mais forte em prefeituras de porte médio. No caso de Mossoró, há sinais que as dificuldades aumentaram no primeiro trimestre do ano, a ponto de a gestão municipal não ter condições de honrar o novo piso salarial dos professores, sob pena de atrasar o pagamento da folha salarial do mês.
As informações de dentro da Secretaria de Planejamento e Finanças dão conta que todos os meses é preciso “raspar o tacho” para completar o pagamento da folha dos servidores. Outros compromissos ficam represados. É o caso da complementação salarial dos garis, que iniciaram a greve nesta terça-feira, 11. A Vale Norte, empresa contratada para a limpeza pública, alega que não cumpriu o último acordo coletivo, assinado em dezembro de 2022, porque a Prefeitura não vem fazendo o repasse da complementação.
Diante do quadro de instabilidade financeira, contratar empréstimo nesse momento é visto por especialistas em finanças públicas como uma temeridade. No caso de Mossoró, o cenário torna-se anda mais preocupante porque o contrato de crédito, pretendido pela gestão Allyson, oferece como garantia de pagamento fonte de receitas como FPM, royalties de petróleo e gás, entre outras.
Mossoró terá que pagar R$ 185 milhões só de juros se contratar empréstimo
O Jornal de Fato teve acesso ao pedido de empréstimo feito pela gestão Allyson Bezerra à Caixa Econômica Federal. Se for concretizado o valor de R$ 200 milhões, o município se comprometerá de pagar só de juros o montante de R$ 185 milhões, quase o mesmo valor do empréstimo. Isso corresponde à taxa de juros de 135,27% ao ano. Quando soma os juros, demais encargos e comissões, o valor global a pagar sobe para mais de R$ 385 milhões.
Além disso, o município terá que arcar com a tarifa de estruturação FEE de 2% no valor do financiamento, o que representa uma conta a mais de R$ 4 milhões, devendo ser pago 1% (R$ 2 milhões) até dois dias após a contratação e 1% (R$ 2 milhões) previamente à realização do primeiro desembolso.
O Pedido de Verificação de Limites e Condições, sob o processo PVL02.000570/2023-84, está em negociação. O contrato ainda não foi fechado e se encontra em fase de preenchimento pelo interessado, no caso, a Prefeitura de Mossoró.
Conforme o documento, o município sofrerá forte impacto em suas contas a partir de 2025, quando começará a amortizar a dívida, caso o empréstimo venha a ser contratado. Naquele ano, a Prefeitura terá que reembolsar à Caixa o montante de mais de R$ 52 milhões (R$ 52.822.822,59).
No ano seguinte, em 2026, o comprometimento é ainda maior, com reembolso de mais de R$ 54 milhões (R$ 54.982.251,86). Em 2027, o valor a pagar continuará alto, mais de R$ 50 milhões (R$ 50.764.298,05). Os reembolsos seguirão altos até 2032, sendo que a última parcela, em 2033, apresenta valor menor, de R$ 6.433.202,61.
Para o leitor ter ideia do que essa operação de crédito representará de comprometimento às contas públicas, a equipe econômica da gestão Allyson vetou a implantação do novo piso salarial dos professores porque não tem orçamento.
O reajuste do piso em 14,95% representa um impacto de R$ 24 milhões nas contas públicas este ano, bem menos do valor que a Prefeitura terá que reembolsar à Caixa só no período de carência do empréstimo, que soma mais de R$ 33 milhões, sendo R$ 7.222.602,53 agora em 2023 e R$ 26.475.639,43 em 2024.
Liberação
Se a Prefeitura e a Caixa firmarem o contrato de empréstimo, os R$ 200 milhões serão liberados em duas parcelas: R$ 80.500.000,00 em 2023, e R$ 119.500.000,00 em 2024.
O prazo para liquidar a dívida contraída é de 120 meses (10 anos), sendo 24 meses (dois anos) de carência e 96 meses (oito anos) para amortização.
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César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.