Sexta-feira, 6, o plenário da Câmara Municipal de Mossoró foi ocupado por lideranças políticas, empresariais, comunitárias e sociais, para receberem autografado o livro “Meu Bacharel – Trajetória Política de Manoel Mário de Oliveira”. Um trabalho que vai além do registro autobiográfico, à medida que se trata de um verdadeiro documento histórico da política local e estadual.
Antes do lançamento, Manoel Mário, ex-vereador e ex-deputado estadual, tomou o Cafezinho com César Santos na sede do Jornal de Fato, na Avenida Rio Branco – Corredor Cultural de Mossoró. Ele fez um resumo do conteúdo do livro, passou a limpo fases importantes da política e acrescentou pautas inéditas. Leia:
Como surgiu a ideia de o senhor eternizar, em livro, a sua trajetória de homem público?
O processo teve início na data de meu aniversário de 80 anos, isso há nove anos. Gilberto Jales (sobrinho, presidente do Tribunal de Contas do Estado/TCE), David Leite (professor e escritor) e outros amigos me questionaram por que eu não escrevia alguma coisa a respeito da minha trajetória de homem público, a partir da minha atuação na Câmara Municipal de Mossoró, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, na Previdência Social. Mesmo incentivado, eu dizia que não tinha história para colocar num livro. Mas, o Dr. Gilberto fez um questionário sobre fatos de minha trajetória de vida para eu responder; eu respondi. Depois, ele me questionou: “o senhor não disse que não tinha nada para escrever?”, e em seguida afirmou: “agora tem”. Daí, começamos a escrever o nosso livro.
O título do livro, “Meu Bacharel”, qual é a origem?
O meu pai, que morreu quando eu tinha seis anos de idade. Foi ele que deu esse nome. Quando em nasci, em 7 de maio de 1934, já tinha três filhas mulheres e o sonho dele era ter um filho homem. Naquela época, só se sabia o sexo da criança quando a parteira dizia; então, quando a parteira abriu a porta do quarto que disse: “é homem, Seu João”. Ele gritou mais forte: “Graças a Deus, nasceu o Meu Bacharel”. Eu passei a minha meninice ouvindo essa história e carreguei comigo por toda a vida.
O livro é uma produção autobiográfica, mas se traduz em documento histórico, com registros de fatos importantes. O que o leitor pode encontrar?
Além de contar a nossa história, a partir da nossa origem, da trajetória política, nós fizemos um relato de fatos importantes da política, trazendo detalhes sobre prefeitos e prefeitas que governaram a cidade de Mossoró, contando desde Jerônimo Dix-sept Rosado Maia até o atual prefeito. Nós tivemos o cuidado de citar alguns fatos de cada administrador, com zelo à história, como forma de registrar exatamente como ocorreu. Outros fatos relevantes estão registrados no livro, como a nossa relação com o Legislativo, a partir da Câmara Municipal de Mossoró, passando pela Assembleia Legislativa, destacando a nossa atuação em temas importantes para a nossa cidade e o Rio Grande do Norte. Todos sabem que a política em Mossoró é radical, mas sempre tivemos uma atuação respeitosa. Hoje, não faço mais parte da política, eu saí da política, mas enquanto estive nela, aproveitei para servir a minha terra e construir amizades.
O senhor poderia ter sido vice-prefeito de Mossoró na gestão do prefeito Antônio Rodrigues de Carvalho. Era o nome cogitado para compor a chapa, mas acabou preterido. O que houve nesse episódio?
Esse processo político se deu em 1968, quando Antônio Rodrigues de Carvalho foi lançado candidato para a sua segunda eleição; ele já havia sido prefeito de Mossoró. O nosso grupo político tinha uma certa dificuldade de nomes, mas o ex-deputado Mota Neto articulou a chapa Antônio Rodrigues de Carvalho com o meu nome para vice-prefeito. Eu era filiado ao PSD de Mota Neto. Só que o tempo foi passando, as articulações políticas acontecendo, e numa reunião acontecida na residência de Renato Costa foi feita uma proposta que a Rádio Difusora só participaria da campanha se o candidato a vice fosse do grupo deles, daí foi escolhido Genildo Miranda. Então, as conversas aconteceram e daí saiu a decisão que a chapa seria Antônio Rodrigues de Carvalho com Genildo Miranda a vice-prefeito.
O senhor saiu do PSD e foi para o MDB de Aluízio Alves, para depois se transferir para o PFL, passando a fazer parte do grupo liderado pelo ex-deputado Carlos Augusto Rosado. A relação com o aluizismo deixou marcas, rusgas, decepções? Esse episódio é contado no livro?
Quando o Governo Federal extinguiu os partidos políticos, durante a chamada ditadura militar, veio a criação dos novos partidos, o Movimento Democrático Brasileiro, o MDB, e a Aliança Renovadora Nacional, a Arena. Inicialmente, a maioria dos políticos ficou na Arena, que tinha até aquela questão da “Arena 1”, “Arena 2”, “Arena verde”, “Arena vermelha”. No MDB, foi a mesma coisa. Então, na primeira oportunidade o nosso grupo político, comandado pelo ex-governador Aluízio Alves, ficou filiado à Arena, e nós acompanhamos a decisão do líder. Mais tarde, com os acontecimentos importantes como a cassação de Aluízio Alves, nós saímos para o MDB e fundamos o partido na cidade de Mossoró. O processo político evoluiu e, como todos sabem, o MDB cresceu muito e, como todos sabem, houve a eleição de 16 senadores. Daí, o próprio grupo de Aluízio Alves ingressou no MDB após a sua cassação.
Mas, como se deu a sua saída do MDB?
Eu passei oito meses na Assembleia Legislativa do Estado. Foi uma excelente experiência, na qual obtive sucesso com o mandato, aprovando matérias de muita importância para o Rio Grande do Norte e até para o país, como foi o caso da mudança da lei que beneficiou as viúvas e os filhos de ex-combatentes. Não vou dizer que fui eu que criei a lei, mas foi o Governo Federal atendendo a um pedido da Assembleia Legislativa por iniciativa nossa. Em 1986, na convenção do MDB, o meu nome foi indicado para disputar um mandato de deputado estadual. Mas, acontece que o partido tinha em Mossoró sete candidatos, quatro do nosso grupo e três do grupo Rosado que tinha se aliado ao MDB. Batalhamos para diminuir o número de candidatos, mas não tivemos sucesso. O então deputado federal Henrique Eduardo disse que o caso de Mossoró estava resolvido, daí, decidi sair. Eu não tinha como disputar uma campanha eleitoral dessa forma, não tinha condições financeiras para enfrentar as estruturas tão caras. Retirei o meu nome e segui outro rumo político. Esse episódio está contado no livro com detalhes.
A partir daí, o senhor passou a fazer parte do grupo liderado por Carlos Augusto Rosado e ficou até encerrar a sua trajetória política. Como ocorreu esse processo de aliança com o chamado “rosalbismo”?
Quando eu ingressei na política, em 1958, com a liderança do deputado Mota Neto, foi com propósito de ter um espaço na vida política do estado para servir a Mossoró e ao Rio Grande do Norte. Então, fomos corretos durante todo o período que tivemos no grupo com Mota Neto, Joaquim Felício de Moura, que me apoiaram e incentivaram para eu ser vereador. Depois, de 1960, apoiamos a candidatura de Aluízio Alves para governador. Como sempre, o meu estilo é de fidelidade ao meu trabalho, a minha luta, aos meus compromissos. Ficamos com Aluízio até 1986. Quando houve a aliança do grupo do ex-deputado federal Vingt Rosado com os Alves, eu fiquei excluído do diretório municipal do MDB. Veio a campanha de 1986, que eu contei acima. Daí, passei a apoiar o sistema político comandado por Carlos Augusto. Veio a primeira eleição da prefeita Rosalba Ciarlini em 1988, da qual eu participei, assim como fiz parte de todas as campanhas de Rosalba até as eleições de 2020, sem ser candidato, mas como colaborador. Quando cheguei ao grupo, filiei-me ao PL, que depois foi transformado em DEM. Fiquei nesse partido até 2014, quando Carlos e Rosalba se desfiliaram da legenda e nós acompanhamos essa decisão.
O senhor não era apenas um filiado ou um simples liderado; pelo contrário, sempre teve as suas opiniões valorizadas e respeitadas por Carlos Augusto. O senhor participou de decisões importantes, sempre sendo ouvido. Daí, quero perguntar sobre uma fase decisiva na carreira recente de Rosalba Ciarlini, que foi a passagem pelo cargo de governadora. Por que o governo Rosalba (entre 2011 e 2014) não vingou como se esperava?
Eu considero que Rosalba Ciarlini fez um governo muito bom, com medidas e ações necessárias, já que ela pegou o estado em situação financeira muito delicada. O governo Rosalba conseguiu fazer um grande empréstimo com o Banco Mundial, o RN Sustentável, que promoveu obras importantes em todo o estado, como o Hospital da Mulher em Mossoró. Agora, o que houve é que os políticos tomaram conta do governo. Era pedaço de fulano, outro de beltrano, deputado tal ocupava outra parte, e daí Rosalba teve dificuldades políticas. Também foi determinante a dificuldade no processo político da capital com o interior do estado, principalmente nessa divisão entre Natal e Mossoró. Ela deixou para o seu sucessor o RN Sustentável, que se ela tivesse sido reeleita teria feito um excelente trabalho no segundo governo. Como deixou agora, na Prefeitura de Mossoró, condições para o atual prefeito (Allyson Bezerra) trabalhar com os recursos do Finisa.
Como o senhor observa o momento atual da política de Mossoró?
Eu estou distante do processo político. Em 2014, quando eu me desfiliei do Democratas, decidi não me filiar a nenhum partido. Deixei o processo político. Mas, eu acho que Mossoró precisa ter uma administração voltada para o bem comum, com muito respeito ao processo politico e administrativo. Acho que Rosalba Ciarlini tem capacidade para buscar novos projetos políticos e um grande nome para Mossoró. Agora, o processo político do momento é muito complicado. Rosalba sabe que é preciso fazer um trabalho muito grande de organização partidária, de reorganização do grupo, de construir novas alianças, para ter força eleitoral. Fora disso, qualquer eleição se torna muita difícil.
Foi a luta do senhor que as viúvas e filhos dos ex-combatentes brasileiros passaram a ter direito à pensão cumulativa, que era vedada por lei. Como foi essa luta vitoriosa?
Em 1980, eu fui ao sétimo Congresso de Vereadores em Belo Horizonte e, em nome da cidade de Mossoró, eu apresentei uma indicação para alterar o artigo 2º da Lei que criou a pensão vitalícia para os ex-combatentes brasileiros. Esse artigo dizia: é intransferível qualquer rendimento dos cofres públicos, inclusive, pensão previdenciária. Na nossa justificativa, para mudar esse artigo, mostramos que a aposentadoria previdenciária não era de cofre público, mas, sim, dos contribuintes que descontavam de seus salários para assegurar o seu futuro. O nosso requerimento foi aprovado na Câmara Municipal, só que em fórum pequeno não teve grande repercussão. Quando fui convocado para assumir uma cadeira na Assembleia Legislativa, no início da década de 80, tive a felicidade de apresentar o mesmo requerimento para alterar o artigo e incluir as viúvas e os filhos na pensão dos ex-combatentes. Além disso, tornar cumulativa o rendimento com aposentadoria e pensão previdenciária. As comissões temáticas da Assembleia Legislativa deram parecer favorável e a nossa proposta foi aprovada pelo plenário. Daí, foi encaminhado à Presidência da República, e, vinte dias depois, o Ministério do Exército encaminhou um ofício à Assembleia Legislativa confirmando que a nossa iniciativa havia sido acatada. Foi uma grande conquista. A Assembleia Legislativa foi vitoriosa, porque foi no plenário da Casa que nós tivemos a felicidade de aprovar uma lei de âmbito nacional, beneficiando viúvas e filhos de ex-combatentes de todo o Brasil com gestão de nossa atuação política.
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César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.