Em 2019, o Governo do Estado estabeleceu a maior política de incentivo fiscal ao setor produtivo do Rio Grande do Norte, como forma de garantir a competitividade frente aos estados vizinhos como Paraíba e Ceará.
O pacote de renúncias representa mais de R$ 1 bilhão/ano, volume considerável para a saúde fiscal do estado.
Agora, o governo precisa reavaliar os benefícios para atenuar os efeitos da decisão da Assembleia Legislativa de derrubar a atual alíquota do ICMS em 20% e fazer retornar ao patamar de 18% a partir de janeiro de 2024. O prejuízo anual será em torno de R$ 700 milhões.
As medidas para mitigar os efeitos da decisão dos deputados de oposição estão sendo analisadas pela Secretaria da Fazenda.
“Vamos analisar todas as questões, como regimes especiais do atacado, querosene de aviação, entre outros benefícios que foram concedidos”, afirma o titular da pasta, auditor fiscal Carlos Eduardo Xavier, nessa entrevista concedida após a derrubada da alíquota do ICMS na ALRN. Ele garante que as medidas são necessárias para o governo manter em bom funcionamento as políticas públicas em prol da população. Leia:
A oposição comemorou a derrubada do projeto de manutenção da alíquota do ICMS em 20%, realçando que derrotou o governo. É isso mesmo, foi uma derrota do governo?
Não se trata de derrota à gestão da governadora Fátima Bezerra. Quem perde é a população, porque é com recursos dos tributos que o estado vai prover serviços públicos à população, como segurança, saúde, educação, social. É sempre importante dizer que essa redução da alíquota do ICMS de 20% para 18% vai na contramão de tudo que está sendo feito no país. O Rio Grande do Norte vai ser o único estado, entre as 27 unidades federativas, com a alíquota menor a partir de 2024. Repito, isso vai trazer um grande prejuízo para a população. Então, essa é a leitura: o prejuízo vai ser para as pessoas que mais precisam das políticas públicas, aquelas famílias mais pobres que não têm plano de saúde, que têm filhos estudando nas escolas públicas e que precisam do estado.
Na prática, qual o efeito que a queda na arrecadação do principal imposto do estado trará ao estado?
Nós fizemos uma ampla revisão de benefícios fiscais ao longo do primeiro mandato da governadora Fátima, dentre eles o governo concedeu uma renúncia no diesel para empresas de transporte público de passageiros, o chamado transporte coletivo. Nesse novo contexto, a gente pode ter que rever isso, o que pode pressionar o valor da tarifa de ônibus que é tão importante para as pessoas que precisam do transporte público. Por outro lado, essa redução da alíquota do ICMS para 18%, ela dialoga diretamente com os serviços públicos. Veja, por exemplo, que estamos nos aproximando da alta estação e, nesse período, usamos os recursos de impostos para colocarmos mais policiais nas ruas, para garantir mais segurança. Se nós temos menos recursos, consequentemente a gente terá uma condição menor para colocar mais homens das forças de segurança nas ruas, podendo trazer uma insegurança maior para a nossa população. Então, repito, o maior prejudicado com o que aconteceu na Assembleia Legislativa, realmente, é a população.
Então, secretário, o senhor entende que a oposição agiu com o propósito de desgastar a atual gestão estadual?
Com certeza. A gente sabe da importância do equilíbrio das contas públicas para a gestão do estado. Eu sempre trago essa situação para o contexto nacional. Em outros 26 estados, as alíquotas ou se mantiveram ou foram majoradas, independente se o governo é de esquerda, é de direita ou de centro, e o único estado do país que vai ter redução de alíquota em 2024 é o Rio Grande do Norte. É uma tentativa clara de desestabilizar as finanças do governo. Agora, vamos trabalhar para reverter essa situação porque o nosso compromisso é com a população. Vamos tomar novas medidas para evitar que essa tentativa de atingir o governo se materialize na prática.
Quais as consequências a médio e longo prazo que a redução da alíquota do ICMS pode provocar?
Além de trazer uma dificuldade maior para a gestão fiscal do estado nos próximos anos, a gente tem que lembrar que de 2024 a 2028 a participação dos estados no bolo federativo ela vai ser parametrizada para o período de transição da reforma tributária, que está em vias de ser promulgada na Câmara dos Deputados. Então, o prejuízo é no curto, médio e no longo prazo para as finanças do estado do Rio Grande do Norte.
O setor produtivo atuou de forma incisiva pela redução da alíquota do ICMS, chegando afirmar, entre as justificativas, que a taxa atual, de 20%, tirava a competitividade do Rio Grande do Norte. O setor apresentou dados que comprovassem essa versão? Ou prevaleceu a tese que cada um defende o seu interesse?
Olha, temos que ser justos aqui, não foram todas as entidades que embarcaram e reproduziram esse discurso de perda de competividade. Eles sabem que o governo da professora Fátima Bezerra promoveu uma ampla política de revisão de benefícios, a gente sabe que os estados vizinhos todos estão pelo menos com alíquota do ICMS em 20%, então não há justificativa nessa perda de competitividade. Pelo contrário, a redução para alíquota em 18% e a consequente necessidade de revisão dos benefícios fiscais que nós concedemos para o setor produtivo, pode, sim, afetar a competitividade desses setores. Mas, o que vai nos mover nesse momento é proteger a arrecadação do estado, para que a gente tenha em 2024 a arrecadação que foi projetada com uma alíquota de 20%, o que não vai mais ser possível devido à decisão da maioria da Assembleia Legislativa.
Considerando a reforma tributária, qual o preço que o Rio Grande do Norte está fadado a pagar com a menor alíquota entre todos os estados do país?
O contexto da reforma tributária é fundamental nessa discussão. Nós temos uma previsão que entre 2024 a 2028, período da transição, a participação das unidades federativas no bolo de arrecadação será parametrizado. Isso significa que ter a menor alíquota do ICMS e se o estado não tomar outras medidas, no ponto de vista das receitas, vai trazer enorme prejuízo para o Rio Grande do Norte. Agora, o governo da professora Fátima, que sempre se pautou pela responsabilidade, vai tomar medidas para tentar reverter o impacto negativo dessa decisão tomada pela Assembleia Legislativa.
Levando em conta o período de transição da reforma tributária, que vai até 2028, as consequências da redução da alíquota do ICMS não afetam apenas a atual gestão, mas, também, governos futuros. Isso comprova que a oposição olhou apenas para o presente?
Exatamente. Nós somos pautados pelo princípio da responsabilidade. Nós estamos defendendo o atual governo, mas também de mandatos futuros, independente quem seja o governador de plantão. Então, essa medida que foi aprovada na Assembleia Legislativa traz o aspecto negativo na questão fiscal do Rio Grande do Norte. Mas, repito, vamos tentar por outros caminhos mitigar os efeitos dessa decisão, vamos adotar medidas que protejam a arrecadação do estado no período de transição da reforma tributária.
Secretário, a oposição repetiu, em discursos, que o cenário delicado das finanças públicas é consequência da falta de gestão, da existência de cabide de emprego em cargos comissionados e cobra uma reforma administrativa. Essa narrativa procede?
Essa questão de cargos comissionados é um mito que vem se repetindo ao longo dos anos. Sempre repetem que o estado precisaria passar por uma reforma administrativa, para reduzir a quantidade de secretarias, de cargos comissionados, e isso, na verdade, é uma falácia. O Governo do Rio Grande do Norte tem, há muito tempo, um dos menores números de cargos comissionados do país e, além disso, com valores de remuneração muitos inferiores à média nacional em relação aos cargos comissionados. Então, não há hipótese de a gente enxugar ainda mais as despesas com os cargos comissionados. A gente sabe da importância desses cargos na administração pública; são eles, em todas as pastas, que trabalham os interesses da população. Para se ter uma ideia, as despesas com cargos comissionados representam menos de 1 por cento do total da folha de pagamento do estado.
O senhor calculou que a redução da alíquota do ICMS para 18% provocará uma perda de arrecadação em torno de 700 milhões de reais por ano. O volume representa uma folha salarial dos servidores públicos estaduais. Como o governo pretende minimizar esse prejuízo?
O nosso plano A era a manutenção da alíquota em 20%. Por determinação da governadora Fátima, a Secretaria da Fazenda está estudando medidas para mitigar os impactos dessa decisão tomada pela Assembleia Legislativa. Temos várias medidas na mesa de discussão. Uma delas é a revisão dos benefícios fiscais, que é uma pauta que nós implantamos em 2019, de modernizar toda a nossa política de benefícios fiscais, e agora nós vamos avaliar o que podemos manter ou não. Vamos analisar todas as questões, como regimes especiais do atacado, querosene de aviação, entre outros benefícios que foram concedidos e a gente vai ter que fazer uma avaliação nesse momento. O importante é que nós vamos adotar as medidas possível para mitigar os efeitos da decisão tomada pela Assembleia Legislativa, de rejeitar a alíquota do ICMS em 20%.
Os benefícios fiscais, as isenções concedidas pelo governo, representam quanto em recursos para o estado?
Passa da casa de 1 bilhão de reais em renúncias fiscais. É um número muito alto, muito importante para a competitividade do estado, mas que nesse cenário de frustração de 700 milhões de reais no ano de 2024, a gente vai ter que rever parcialmente essas renúncias.
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César Santos é jornalista desde 1982. Nasceu em Janduís (RN), em 1964. Trabalhou nas rádios AM Difusora e Libertadora (repórter esportivo e de economia), jornais O Mossoroense (editor de política no final dos anos 1980) e Gazeta do Oeste (editor-chefe e diretor de redação entre os anos 1991 e 2000) e Jornal de Fato (apartir dos anos 2000), além de comentarista da Rádio FM Santa Clara - 105,1 (de 2003 a 2011). É fundador e diretor presidente da Santos Editora de Jornais Ltda., do Jornal de Fato, Revista Contexto e do portal www.defato.com.