Quarta-Feira, 25 de dezembro de 2024

Postado às 10h15 | 05 Ago 2024 | redação Leila Tabosa: “Mulheres que andam com outras mulheres são mais fortes”

Crédito da foto: Divulgação Leila Tabosa conversou com DOMINGO a respeito da obra “Ela nasceu Lilás & outras mulheres”

Por Ângela Karina – DOMINGO/Jornal de Fato

“Ela nasceu Lilás & outras mulheres”. Este é o título do mais recente livro da multifacetada escritora Leila Tabosa, com pré-venda a partir desta segunda-feira, 5, pelo perfil no instagram @ela.nasceu.lilas e whatsApp (84) 99467-3158. O lançamento pela Podes Editora ocorrerá dia 18 de agosto, a partir das 15h no Espaço Mon Petit Café & Livros, na rua Duodécimo Rosado, aqui em Mossoró.

A obra marca a estreia da escritora na ficção, sendo este livro de contos – o primeiro – a ocasião para Leila abordar temas como violências doméstica e de gênero, sobrevivências femininas e infantis na periferia, além de outras urgências sociais.

Embora ficcional, este livro repleto de temas tão relevantes e atemporais é cheio de personagens femininas retratadas na literatura da escritora, personagens estas que ensejarão reflexões profundas nos leitores de “Ela Nasceu Lilás”.

Leila Tabosa fala sobre essas urgências sociais do seu lugar de fala, pois nasceu na periferia de Fortaleza-CE e lá morou até 1996, quando decidiu vir para o Rio Grande do Norte em busca de que bons ventos soprassem a seu favor. E sopraram. Porém, como todo e qualquer cata-vento, precisou de um tempo para pegar impulso e se estabelecer.

A princípio, morou em Natal e lá teve que conciliar estudos, maternidade e trabalho; em função dessa tripla jornada à qual a maioria de nós é submetida, concluiu o Ensino Médio por meio do EJA (Educação de Jovens e Adultos). No curriculum, acumulou experiências profissionais em restaurantes de fast food, lojas de roupas femininas, dentre outras de menor relevância.

Leila era aposta de poucos, talvez dela própria. Contudo, acreditar em si mesma foi determinante para Leila Maria de Araújo Tabosa, hoje, aos 46 anos, cidadã Mossoroense, chegar ao patamar de professora Pós-Doc respeitada pela sua capacidade intelectual, com vasta produção acadêmica.  

Quem conhece Leila mais de perto, sabe das dores na alma que ela teve que suportar desde a infância, e que a fizeram feminista por convicção e devoção; fizeram-na intensa. Assim, Leila precisou traçar o caminho da luta e resistência não só para si, mas para nós mulheres de modo geral.

Uma das formas de resistência da autora é por meio da sua atuação profissional enquanto professora Doutora da Universidade do Estado do Rio Grande – Uern. No ofício e enquanto pesquisadora da literatura de autoria feminina busca romper o apagamento historiográfico e cultural vivenciado por essas autoras. De acordo com Tabosa, a “literatura de autoria feminina nunca foi bem-vinda nos registros da historiografia da literatura tradicional brasileira”, assevera.

A partir dessa constatação, Leila, que também é roteirista de teatro e curadora de artes visuais, defende a ampliação de uma rede de apoio baseada na sororidade e dororidade. Para ela, “precisamos ser rede de apoio umas para as outras e falar de tudo”, reflete.  Simbolicamente, a cor lilás representa a luta das mulheres por direitos iguais.

Leila Tabosa conversou com DOMINGO a respeito da obra “Ela nasceu Lilás & outras mulheres”, mas também sobre sua trajetória até aqui. Confira.

 

Ela nasceu Lilás & outras mulheres pode ser considerada uma autobiografia? Além disso, em que escola literária estaria?

Quando o assunto é precisamente violência doméstica, a gente não escreve sobre o que não sabe; a gente não escreve sobre o que não testemunha; não há devaneios. Com base nisto, este livro é uma ficcionalização testemunhal associada à matéria mais legítima de uma escritora: a imaginação. Uma escrita sem imaginação não tem pulso vital.  Os dezesseis contos deste livro são narrativas ficcionais com base em testemunhos documentais visíveis, palpáveis, marcados. Sobre a historiografia literária, é fato que as mulheres não possuem espaço nas historiografias tradicionais. Mas mesmo sem querer rotular ou categorizar o livro em este ou aquele capítulo suposto literário, posso sinalizar se tratar de uma prosa neorrealista, mas com aberturas para outras perspectivas críticas de visão. O livro não preza pela estética canônica, eurocentrada, ao contrário, caminha pelas margens periféricas.

“Ela nasceu Lilás” & outras mulheres reverbera pautas feministas?

Reverbera, sim.  O livro é um convite à conferência de nossas existências femininas no espaço social da periferia de uma grande cidade nordestina. Então, eu me pergunto: o feminismo chega a esse lugar? A gente precisa pensar sobre essa condição feminina dentro de uma interação sociológica e geopolítica, inclusive em todos os espaços sociais. O direito humano da mulher de existir sem ser espancada e com a dignidade de saneamento básico, por exemplo, não é respeitado neste espaço ficcional, ao menos na época em que os contos se dão. As narrativas acompanham mais ou menos quase meio século de histórias – contos ambientados nos anos 80, 90 até se chegar à contemporaneidade com a elevação feminina do conto “Equilibristas” – de mulheres expropriadas de tudo: de afeto, de respeito, do direito à vida, especialmente. O livro eleva mulheres, apesar de seus contextos.

 

Quais são as suas inspirações de mulheres feministas? Elas são essas outras mulheres de quem você se acompanha?

São muitas as inspirações que tenho de mulheres feministas. Aqui do Brasil, o movimento sufragista é algo muito potente para nós e para nossas conquistas do direito ao voto. Eu penso nisso porque estamos em Mossoró e você vai entender, Ângela.  Josephina Álvares de Azevedo, uma mulher jornalista e dramaturga que escreveu sobre o voto feminino tanto em crônica de jornal quanto em sua peça de teatro, talvez ela seja minha primeira referência feminina-feminista de luta. Estamos em Mossoró, uma terra histórica de mulheres de luta. O primeiro voto feminino é aqui, com a Celina Guimarães. Estamos nós duas, Ângela, você e eu agora, na terra do Motim das Mulheres. Isso tem uma força imensa para mim. A Josephina foi apagada tanto dos compêndios de literatura quanto dos compêndios de teatro. Por isso, a convido para estar aqui, hoje, conosco. Sou leitora das teorias. Das mulheres teóricas: da Lélia González; da Djamila Ribeiro; da Sueli Carneiro. Neste momento, sou leitora mais precisamente das feministas brasileiras e algumas outras latinas.

Como é essa mulher nordestina periférica contemporânea-latino-americana? O que a diferencia das demais?

Eu quero esta resposta dos leitores e das leitoras. O fato é que ser mulher nordestina possui uma espécie de força. E ser uma mulher nordestina que tem como seu ponto geodésico a periferia é uma identidade talvez desconhecida (ainda), quando a gente pensa na imensidão do Brasil. Temos algumas identidades conferidas como a da mulher nordestina sertaneja; como a mulher nordestina no contexto praieiro. Os filmes, as novelas, conferem-nos essa visibilidade.  Isso é maravilhoso. São formas de existência nossa.  A mulher nordestina contemporânea de contexto periférico tem sua particularidade de existência, ela encontra meios de sobrevivência econômica no seu entorno.  No subúrbio, essa mulher faz movimentar a economia daquele lugar trabalhando em feiras livres, vendendo artesanatos que aprendeu a fazer com suas ancestrais sertanejas; elas buscam inúmeras formas de sobrevivência. As mulheres nordestinas da periferia são as chefas de família daquele espaço, elas possuem essa responsabilidade a despeito dos seus graus de escolaridade. Elas precisam da sua conferência de visibilidade. Assim, suas necessidades também serão visibilizadas.

Como estabelecer uma rede de apoio baseada na sororidade e dororidade?

A herança do patriarcado nos prejudica em todos os sentidos. E mais ainda quando o assunto é rede de apoio. A sociedade é patriarcal, mesmo que saibamos a importância do matriarcado na construção social nordestina. Fomos ensinadas a ser rivais entre nós; fomos ensinadas a não termos amigas “de confiança”; fomos ensinadas que moça solteira não pode ser amiga de mulher casada; os maridos, em sua maioria, “não gostam” quando suas companheiras possuem amigas com quem conversar. Uma mulher casada sair para tomar um café com suas amigas ainda é uma situação que soa estranho, infelizmente. Toda essa construção favorece ao sistema patriarcal, tornando a rede de apoio impraticável para a maioria das mulheres. Dessa forma, elas se tornam vítimas do sistema. 

FICHA TÉCNICA

Título: Ela nasceu lilás & outras mulheres

Autora: Leila Tabosa

Capa: Myllena Diniz com aquarela de Isaías Medeiros

Orelha: Bia Crispim

Prefácio: Daiany Dantas

Apresentação: Verônica Aragão

Introdução: Araceli Sobreira

Contracapa: Taniamá Barreto, Mirla Cisne, Fernanda Cardoso Nunes e Aluísio Barros.

Valor: R$ 35,00 no primeiro mês de lançamento

Instagram: @ela.nasceu.lilas

Tags:

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