Por g1
O preço das carnes ficou mais caro pelo terceiro mês seguido em novembro. No acumulado dos 12 meses, a alta foi de 15,43%, aponta o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgado nesta terça-feira (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A inflação da proteína bovina ficou em queda por um ano e meio, mas voltou a aumentar em setembro de 2024.
Entre os cortes bovinos, o patinho foi o que mais encareceu no período, com a inflação de 19,63%. Ele é seguido do acém (18,33%), do peito (17%) e do lagarto comum (16,91%).
A única peça que ficou mais barata foi o fígado, com queda de 3,61%, aponta o índice.
Considerando a variação mensal, as carnes tiveram uma alta de 8,02%.
Quatro fatores ajudam a explicar a alta de preços, segundo economistas consultados pelo g1:
Ciclo pecuário: após dois anos de muitos abates, a oferta de bois vai começar a diminuir no campo;
Clima: seca e queimadas prejudicaram a formação de pastos, principal alimento do boi;
Exportações: Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo e vem batendo recordes de vendas.
Renda: queda do desemprego e valorização do salário mínimo estimularam compras de carnes.
Segundo os economistas, esses fatores também indicam que o preço não deverá baixar em 2025, e a alta pode se estender até 2026. Entenda mais abaixo.
O IPCA foi divulgado dias depois do acordo comercial firmado entre a União Europeia e o Mercosul, na última sexta-feira (6). A carne está entre os produtos que terão imposto reduzido nas vendas para o bloco europeu.
Apesar do anúncio, não existe uma previsão de quando a medida entrará em prática. O novo texto ainda deve passar por revisão, tradução, assinatura e ratificação antes de entrar em vigor. Entenda aqui o que está em jogo para o agro brasileiro com o acordo.
Altas e baixas do ciclo pecuário
A oferta de bovinos começou a ficar mais restrita no campo e um dos motivos que explica isso são os ciclos da pecuária, explica Felippe Serigati, coordenador do mestrado profissional em Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Em resumo, eles funcionam assim:
alta do ciclo: quando há uma expectativa de alta nos preços do bezerro, os pecuaristas, em vez de abater as vacas, as mantêm nas fazendas para reprodução, movimento que provoca um aumento nas cotações dos bovinos (boi gordo, bezerro, novilhas, boi magro, vaca gorda, etc.);
baixa do ciclo: quando as projeções do preço do bezerro começam a cair, um volume maior de fêmeas é encaminhado para os abates. Isso amplia a quantidade de carne no mercado, gerando uma queda nas cotações dos bovinos.
A redução do valor das carnes no último um ano e meio correspondeu, justamente, a um período de grande volume de abates de bois e vacas no Brasil. No terceiro trimestre deste ano, inclusive, os abates ultrapassaram, pela primeira vez, 10 milhões de cabeças, segundo uma série histórica do IBGE iniciada em 1997.
No momento, o ciclo está na fase oposta. Muitas fêmeas foram abatidas, há um menor número de nascimentos e menos animais disponíveis, o que também eleva o preço do bezerro.
"Há, portanto, uma perspectiva de diminuição da produção de carne lá na frente. Então, em 2025, a gente deve ver os preços da carne bovina mais pressionados [ou seja, mais altos]", prevê Serigati.
Thiago Bernardino de Carvalho, responsável pela área de pecuária no Cepea/USP, acrescenta que a alta nos preços ao consumidor tende a se estender por 2026. Isso porque leva tempo até que um bezerro se torne um boi gordo, ou seja, que fique pronto para ser abatido.
"Os bezerros vão começar a nascer no ano que vem, vão desmamar em 2026, e se tornarem boi gordo lá em 2027, 2028", explica Carvalho.
A maior seca da história recente do Brasil e as queimadas também ajudam a explicar a alta de preços agora no final do ano: elas prejudicaram a produção de pasto, que é o principal alimento do gado no país.
Nesses momentos, é comum que o pecuarista confine o seu gado para engordá-los com ração, o que acaba saindo mais caro. Como os preços do boi gordo ficaram em baixa boa parte deste ano, os produtores decidiram não fazer investimento, diz Carvalho.
Exportações em alta
Enquanto a produção caminha para um momento de baixa, a demanda externa por carne está aquecida. E o Brasil, como maior exportador global da proteína, vem batendo recordes de exportação.
Exemplo disso é que, em outubro, as vendas nacionais da proteína alcançaram 301.166 toneladas, o maior volume embarcado para o mês, de acordo com a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), que tem uma série histórica das vendas desde 1997.
"Por que nós estamos exportando volumes recordes? Porque outros fornecedores de carne bovina não estão conseguindo atender a demanda externa. A Austrália está recompondo o seu rebanho bovino. Os Estados Unidos estão no seu menor rebanho desde 1950. A Argentina está voltando agora para o mercado", comenta Serigati.
O aumento das exportações reduz a quantidade de carne disponível no país, estimulando uma alta do preço da carne para o brasileiro.
Renda maior e festas
No Brasil, as compras de carnes também estão aquecidas e isso contribui para manter os preços da proteína em alta.
"A taxa de desemprego está lá embaixo, a remuneração média está aumentando e a população ocupada está crescendo", comenta Serigati.
"Houve ainda uma política de valorização do salário mínimo, e reajustes de uma série de benefícios sociais, como a Previdência, BPC [Benefício de Prestação Continuada], Bolsa Família, seguro-desemprego. Isso é mais renda chegando", acrescenta o professor da FGV.
"E o bifão é a preferência nacional. Se [o brasileiro] tiver dinheiro no bolso, ele vai preferir consumir carne bovina", diz Serigati.
O pagamento do 13º salário e de bonificações neste final do ano, somada à chegada das festas da época, deve manter a demanda aquecida, conclui o economista Allan Maia, da Safras & Mercados.
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