Domingo, 24 de novembro de 2024

Postado às 20h00 | 15 Jun 2024 | redação Arão mantém rotina de títulos e vibra por sucesso em experiência na Europa

Crédito da foto: Cahê Mota / ge Willian Arão com a medalha de campeão da Copa da Grécia

Por Bruno Côrtes e Cahê Mota — ge

Rotina: é um conjunto de hábitos e atividades que uma pessoa realiza regularmente. Sendo assim, podemos dizer que Willian Arão tem a rotina de ser campeão.

Há duas temporadas na Europa, após se tornar um dos jogadores mais vencedores da história do Flamengo, o volante já soma dois títulos. O mais recente deles aconteceu vestindo a camisa do Panathinaikos, a Copa da Grécia, 25º troféu em 12 anos como profissional.

Arão é daqueles que mentaliza o que deseja e passa essa mensagem para os companheiros - mesmo que seja em tom de cobrança mais rígida. E é desta maneira que só passou em branco em duas temporadas na carreira: 2016 e 2018.

- Eu boto na cabeça que um dos principais objetivos que eu tenho como carreira é ganhar títulos, marcar o meu nome onde eu passar. O jeito que eu treino, que eu influencio os companheiros é assim também.

 

Eu falei para eles: "Eu venho pra ser campeão, não venho pra ser o melhor amigo de ninguém. Eu venho para ganhar, eu quero ganhar, eu quero ser competitivo, quero extrair o melhor dos meus companheiros e o melhor de mim. Quero melhorar a cada treino, cada dia". Acho que isso é uma coisa boa também que eu levo para o lugar onde eu estou.

 

Indicado por Jorge Jesus para o Fenerbahçe, o volante realizou de forma tardia o sonho de jogar na Europa. Aos 30 anos, se mandou para Turquia, onde também foi campeão da Copa.

Com a saída do Mister para o Al Hilal, o futebol saudita chegou a abrir as portas, mas o europeu seguiu sendo mais sedutor. Com mais dois anos de contrato com o Panathinaikos, Willian Arão deu a cartilha do sucesso que vai além do campo.

Títulos de Willian Arão

  • Flamengo: Libertadores (2), Brasileirão (2), Supercopa (2), Carioca (4), Recopa, Copa do Brasil, Taça GB (3), Taça Rio e Flórida Cup.
  • Corinthians: Libertadores, Mundial, Paulista e Recopa
  • Botafogo: Série B e Taça GB
  • Fenerbahçe: Copa da Turquia
  • Panathinaikos: Copa da Grécia

- Eu me preparei psicologicamente, mentalmente. Além da questão do jogo, muitos jogadores brasileiros chegam lá e não falam inglês, não falam o básico do inglês. E isso é uma dificuldade muito grande porque depois você não consegue se relacionar com o seu companheiro, você não consegue depois ter uma vida fora dali. E tudo acaba se tornando mais difícil para o jogador, para a família. Então, me preparei para isso.

Willian Arão com o troféu da Copa da Grécia — Foto: Divulgação

Willian Arão com o troféu da Copa da Grécia — Foto: Divulgação

Campeão da Copa e eleito para a seleção do Campeonato Grego como zagueiro, Willian Arão recebeu o ge para um bate-papo sobre a experiência no Velho Continente, os planos de seguir os passos de Filipe Luís e se tornar técnico, a relação com o Flamengo e a torcida pelo ex-companheiro Vini levar a Bola de Ouro:

- Nada mais justo!

 

Confira toda entrevista

Segunda temporada na Europa, segundo país e segundo título conquistado. Como foi chegar ao Panathinaikos novamente campeão?

Muito feliz. Mais uma temporada que podemos dizer que de sucesso, né? Terminando com o título. Claro que eu queria ganhar a liga também, mas não foi possível. Acho que de sucesso porque tive um bom desempenho. A gente foi campeão da Copa. Então, muito feliz por mais um ano sem lesões, que é o que é o mais importante. Muito feliz por mais esse desempenho.

Assim como foi em 2020 no título do Brasileirão, você atuou nesta temporada muitas vezes como zagueiro. Pegou gosto?

É, né, tivemos um problema lá no pós, quando fechou a janela, os dois zagueiros se machucaram, e eu fui improvisado, joguei bem, e o treinador falou: “Cara, eu preciso de você ali”. Eu falei: “Estou disposto a ajudar. Se você entende que eu ali vou ajudar muito o time, eu estou disposto. Vamos lá”. Então, eu fui, comecei a jogar bem, ajudei o time bastante. Estou ali pra ajudar a equipe, e acho que consegui.

 

É uma posição que você aprendeu a ficar mais à vontade?

Ah, eu gosto de jogar zagueiro. Eu sou volante, é onde eu me sinto melhor, é onde eu acho que eu desempenho melhor, mas se eu tiver que jogar de zagueiro, eu jogo tranquilamente. Dessa vez, eu joguei numa posição diferente, que ainda foi pelo lado esquerdo. Quando eu fui campeão no Flamengo, jogava pelo lado direito. E muda o jeito que você domina, você domina a bola para fora, então você já está com a sua perna boa. Quando você domina para a esquerda, a gente quer aprimorar isso também. Mas foi um desafio legal, todo mundo me elogiou bastante lá, tanto de zagueiro quanto de volante. Acredito que eu fiz uma boa temporada, individualmente falando.

E a vida na Grécia? Atenas e o Rio têm similaridades?

É muito parecido com o Rio de Janeiro, mas é uma cidade que não tem muito luxo, né? Você não encontra shopping lá, você não encontra restaurantes muito famosos. Você tem a praia, lindíssimas praias, você come muito bem, então assim, é muito parecido com o Rio. Claro que depois lá tem uma segurança que é fora de série. Mas de modo geral é muito parecido com o Rio mesmo, então por isso que a gente se adaptou bem também.

 

E entre Panathinaikos e Flamengo, você consegue apontar similaridades?

São dois times grandes, que têm uma cobrança muito grande, que são acostumados a vencer, e eu acho que é essa principal semelhança. Lá, obviamente, eles te cobram de uma maneira diferente que eu não vou nem dizer que é do Flamengo, mas do Brasil no modo geral. Cobram jogadores com mais respeito, e a cobrança não vem pelo lado pessoal, vem mais pelo lado profissional e de desempenho, o que eu acho que é justo. Essa cobrança existe, e a gente foi cobrado lá por não ter ganha liga porque era o principal. O objetivo nosso que era ganhar liga, então a gente também foi cobrado, mas de uma forma respeitosa.

Willian Arão com a taça de campeão brasileiro de 2020 — Foto: Arquivo pessoal

Willian Arão com a taça de campeão brasileiro de 2020 — Foto: Arquivo pessoal

São 25 títulos na carreira e apenas dois anos sem levantar troféu desde que virou profissional. Há segredo para essa rotina?

Eu boto isso na cabeça, um dos principais objetivos que eu tenho como carreira é ganhar títulos, marcar o meu nome onde eu passar, o jeito que eu treino, que eu influencio os companheiros também. Eu falei para eles: "Eu venho pra ser campeão, não venho pra ser o melhor amigo de ninguém. Eu venho para ganhar, eu quero ganhar, eu quero ser competitivo, quero extrair o melhor dos meus companheiros e o melhor de mim. Quero melhorar cada treino, cada dia" e eu acho que isso é uma coisa boa também que eu levo para o lugar onde eu estou.

Coincidentemente você e o Rodinei, que passaram por tantas cobranças no Flamengo, são rivais na Grécia e ambos foram campeões. Como é a relação de vocês em Atenas?

É verdade, é verdade. E a gente tem uma amizade muito grande. Eu moro a cinco minutos da casa dele. Nossos filhos estão mais juntos do que nós, são quase da mesma idade. Então, eles brincam bastante juntos. Sempre que pode a gente se reúne, marca de se encontrar para noite de jogos. Apesar de estar em time rival, a gente se ajuda porque morar fora muitas pessoas acham que é fácil, mas não é. Às vezes bate a saudade da casa, dos amigos e a gente, como tem um contato já de longa data, eu conheço o Rodinei desde 2012, então são 12 anos de amizade, né. A gente tem muitas histórias juntos e é legal. Fiquei muito feliz por ele também porque ele é um jogador que merece todo sucesso.

 

E vocês conversam da virada que a carreira deu? Foram alguns momentos complicados no Flamengo, e agora são campeões na Europa...

Era um momento delicado. Eu passei e ele passou, outros jogadores passaram, e a gente meio que se apoiava um no outro ali para poder ter força e retomar a confiança, retomar o bom momento. Hoje, a gente olha para atrás e vê que tudo isso valeu a pena. Quando a gente está lá e o pessoal fala em cobrança, a gente responde: “Não, a cobrança não é grande. Isso aqui não é pressão. Vocês não sabem o que é pressão”. A gente já está acostumado, já está calejado com isso. Então, a gente acaba que enfrenta as situações de uma maneira muito mais tranquila.

 

Questionam muito o nível de competitividade de ligas menores na Europa, mas grandes nomes como Marcelo e James não triunfaram na passagem pela Grécia. O que você pode falar dessa experiência no futebol grego?

A competitividade é muito grande, o desafio diário é muito grande. Apesar de você ter ali uma paridade de quatro times maiores, você tem o Aris também, que é a quinta força. Os outros times você enxerga um pouco mais abaixo. Mas é muito difícil de ganhar deles, porque os campos são pequenos, são bons os gramados, mas é mais difícil de você jogar. Então você tem que se reinventar, às vezes você pega um time que é muito mais força e joga com 11 atrás. Você tem que manter o alto nível sempre. Concentração sempre. Você deu alguns exemplos, alguns nomes aí que passaram por lá e digamos que não tiveram sucesso, não conseguiram desempenhar o futebol que desempenharam em outros lugares. Então, o futebol grego, sim, é muito forte, tem uma competitividade muito alta. Isso é verdade.

 

Você realizou o sonho de jogar na Europa já com 30 anos e conseguiu ter sucesso muito rápido. Como você definiria essas duas temporadas: na Turquia e agora na Grécia?

Eu me preparei muito para isso, né? Sempre foi meu sonho jogar na Europa, jogar em grandes ligas, grandes clássicos: Fener x Gala, Fener x Besiktas, Panathinaikos x Olympiacos agora. Jogar grandes clássicos foi meu sonho, mas eu me preparei. Eu me preparei psicologicamente, mentalmente. Além da questão do jogo, muitos jogadores brasileiros chegam lá e não falam inglês, não falam o básico do inglês. E isso é uma dificuldade muito grande porque depois você não consegue se relacionar com o seu companheiro, você não consegue depois ter uma vida fora dali. E tudo acaba se tornando mais difícil para o jogador, para a família. Então, me preparei para isso. Por isso eu consegui conversar com o treinador, entender a ideia do treinador e passar as ideias também para o treinador.

Ninguém precisa ser perfeito, mas eu acho que a pessoa tem que saber o mínimo para você ter uma conversa com o treinador, o diretor, o presidente. Quando eu cheguei lá eu falei: “Cara, eu preciso fazer tudo o que me trouxe até aqui”. Continuar treinando, continuar batalhando, continuar dando o máximo a cada treino. Impulsionar meus companheiros. Se tiver que brigar com eles, brigar, sem ter medo do que eles vão achar, porque eu quero ganhar. Eu quero ser campeão. Então, acho que eu consegui fazer isso e tenho feito isso. Fui na Turquia e consegui ganhar com time não ganhava há dez anos. Vim para o Panathinaikos e fui campeão de novo. São duas ligas diferentes, dois países diferentes. Um prazer enorme.

Turquia e Grécia são países conhecidos pela relação calorosa dos torcedores com o futebol. Há algum paralelo com o Brasil?

Olha, é muito semelhante, né? Tanto o turco quanto o grego, eles têm uma semelhança com o brasileiro no quesito futebol. A Grécia no quesito futebol é muito intensa. Semana de clássico, só fala disso, é clima diferente, tudo é diferente. E lá tem um fator ainda maior de diferença, né? São clássicos de torcida única. Então você já vai jogar fora sabendo que o estádio vai estar lotado e que é todo mundo contra você. Tanto a Grécia quanto a Turquia vivem o futebol, muito intenso, que dão muito valor a isso e influenciam muito na sociedade.

 

Essa paixão te gerou alguma situação curiosa com torcedores por lá?

Isso aí tem um monte. Então, você vai na Turquia, até hoje, quando eu estou passeando, eu ainda encontro torcedores turcos e eles me recebem muito bem. "Você tem que voltar, foi uma injustiça não ficar com você, deixar você sair ". Faz parte, mas é bem engraçado que no Gala x Fener no estádio do Gala tinha um monte de torcedores me xingando. E no meio da torcida do Gala tinha um cara com camisa do Flamengo. E eu falei: “Bom, pelo menos um cara aí que está torcendo para mim”.

 

E na Grécia, houve algo parecido?

Na Grécia, o pessoal é muito parecido com o Brasil, muito receptivo. Te tratam super bem. Gostam de fazer as coisas, de dar as coisas para os jogadores. Muitas vezes a gente vai sair para o jantar e quando vai ver a conta já está paga. Falam: “A gente quer tratar você bem. A gente quer ver você bem em tudo”. Mas não é só comigo, o Arão. É uma forma de passar amor aos jogadores. Então, esse carinho que eles têm é muito legal.

Durante as férias, você visitou o Filipe Luís no Ninho. Eu sei que vocês se formaram juntos no curso para treinador da CBF. Vai seguir os passos como ele?

Não está 100% decidido. Eu tenho vontade. Vou estudar mais. Mas eu deixo bem aberto, eu vou ver o que o futuro reserva, o que vai acontecer, que direção que as coisas vão tomar. Eu tenho vontade de trabalhar um pouco no meio de futebol sim, ou pelo menos ter uma experiência para ver como que é, como treinador ou como auxiliar. Eu fui visitar o Filipe e fiquei. Cheguei lá 10h da manhã, saí de lá 16h da tarde, conversando sobre táticas. É legal, eu gosto muito disso, escutar as ideias dele, transmitir as minhas, enfim, você sempre aprende. Foi bem legal.

 

Houve também um encontro com vários ex-companheiros de Flamengo... Famílias do Diego, do Juan, entre outros. É uma amizade que ultrapassou a convivência no mundo da bola?

O grupo era muito família. Claro que tinha pessoas com pensamentos diferentes em um grupo de 30 atletas, mas, independentemente disso, nós todos éramos muito amigos. A ponto de se cobrar e ficar sem se falar, como vários jogadores já relataram isso. No outro dia, o outro fazia brincadeira. Quando eu brigava com o Renê ou às vezes com o próprio Filipe, a gente ficava sem se falar, chegava no café da manhã e o outro cara que sabia da nossa briga falava: "Ei, vocês vão ficar sem se falar? Vocês não vão conversar? Resolvam esse negócio". Pela brincadeira e pelo grau de intimidade que a gente tinha, porque faz parte do dia a dia. É uma coisa que a gente levou para a vida, porque eu mesmo passei seis anos e meio no Flamengo, tive contato com o grupo, com inúmeros jogadores, e eu tenho prazer de falar que quase que todos eles foram meus amigos. Isso é uma coisa muito, muito legal.

 

Para muita gente aqui no Brasil, você vai ser sempre o “Arão do Flamengo”. De que maneira você mantém essa relação com o clube? Costuma acompanhar à distância?

É fácil falar, porque os meus filhos nasceram aqui, o meu filho fala de Flamengo, o meu filho nasceu no Flamengo. Há muitos quadros na nossa casa do Flamengo, muitas coisas que a gente tem em casa é do Flamengo, porque eu passei a maior parte da minha carreira como jogador no Flamengo. Então, eu tenho um carinho imenso, torço sempre. Assistir ao jogo é mais difícil. Quando tem jogo 16h da tarde, eu consigo às vezes acompanhar.

 

Para fechar, você viu o Vini crescer ali no Flamengo e agora ele é favorito para ser o melhor do mundo. O quanto isso te deixa orgulhoso?

Eu acho que ele se lapidou e está em constante evolução, ele não para de evoluir. Ele tem uma margem ainda para grande evolução. De requisitos técnicos, mental do jogo... Fisicamente, eu acho que não, porque ele é um fora série, que dá 30, 40 sprints por jogo. É difícil você encontrar um jogador que tenha essa capacidade física. Você vê um menino jovem, mas que é sempre disposto a aprender, sempre disposto a escutar, sempre com sorriso no rosto, sempre de bem com a vida. Hoje, o mundo está se rendendo a ele. Também nas questões sociais que ele aborda fora do campo também, que é importante. Ver essa pessoa que ele está se tornando, que ele já se tornou. Eu fico muito feliz por, de alguma forma, ter ajudado ele, ter contribuído para isso. Ele é um garoto especial, todo mundo fala dele. Fala isso porque ele é essa pessoa feliz, carismática, está sempre alegre de bem com a vida. Acho que nada mais justo do que concluir essa temporada, que foi maravilhosa, com uma Bola de Ouro. Ele merece. Para mim, ele foi, sim, o melhor desta temporada.

 

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