O Rio Grande do Norte registrou um aumento de 119% nos casos de violações dos direitos das crianças no primeiro semestre de 2022. Os dados, levantados pelo Instituto Santos Dumont (ISD), a partir do Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH), confirmam a escalada da violência contra as crianças que vem sendo registrada há pelo menos dois anos no Brasil.
O estado segue uma tendência nacional de aumento dos casos de violações. Em todo país, o primeiro semestre de 2022 registrou um aumento de 125% nesses casos em relação ao primeiro semestre do ano anterior, de acordo com a plataforma. Segundo especialistas, esse cenário tem sido reforçado pelo contexto da vulnerabilidade socioeconômica crescente no Brasil desde o começo da pandemia da Covid-19.
Em números absolutos, o RN teve 4.911 violações registradas até junho de 2022. No mesmo período de 2021, 2.235 casos foram registrados. Nacionalmente, 98.035 violações foram computadas em 2021, ao passo que 221.079 aconteceram em 2022 de acordo com a plataforma federal. O número de violações não foi o único que apresentou crescimento: as denúncias no Rio Grande do Norte foram de 555 em 2021 para 958 em 2022, um aumento de 72.6%.
Uma possível explicação para o aumento de denúncias e violações registradas, segundo a preceptora assistente social do ISD Alexandra Lima, é a flexibilização das medidas de isolamento, que possibilitou às crianças ter mais contato com agentes terceiros, como profissionais da educação, amigos ou outros familiares. O aumento dessa socialização de potenciais vítimas permite que a atenção sobre esses casos aumente e chegue aos órgãos responsáveis.
As violações dos direitos humanos da criança consistem em qualquer interferência que se comete contra a integridade física e psíquica, desde maus tratos físicos até a omissão do cuidado que seria necessário para que a criança tenha um desenvolvimento saudável, explica Alexandra Lima. Os casos de denúncias e violações registradas contra esse grupo, atualmente maiores que os índices para adolescentes e idosos, surgem em um contexto mais amplo, que ultrapassa a violência em si.
“A violência permeia todas as pessoas, principalmente as de baixa renda que são acometidas por outros tipos de violência. Então, cria-se um ciclo de violações que reflete diretamente no contexto das crianças e adolescentes. A gente vê um número crescente de famílias que estão nas periferias e sujeitas à violência urbana. Isso também pode refletir na convivência, nos conflitos que são gerados dentro do seio familiar”, explica a assistente social.
Para a preceptora, existem fatores externos relacionados às relações e conflitos na estrutura das próprias famílias, provocados por aspectos socioeconômicos e violência cotidiana. Essas características refletem no elo mais frágil desse núcleo familiar, que é a criança. Essa fragilidade existe por ser mais difícil ter acesso à ferramentas de identificação e solicitação de ajuda a uma terceira pessoa na infância, principalmente porque a maior parte dos casos ocorre dentro da família.
Como denunciar
Ao perceber que uma criança está sofrendo violência, maus tratos, ou omissão de algum tipo, denuncie por canais de denúncia anônima, como o Disque 100, que é gratuito, ou por órgãos especializados, como Conselho Tutelar, Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente e Delegacia de Defesa da Criança e do Adolescente.
Dia da Infância
O Dia da Infância, comemorado no dia 24 de agosto, é uma data importante para conhecer o papel da sociedade na proteção desse grupo. Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é dever de todos reforçar o cuidado com a infância e a adolescência. Quem está por perto e tem informações sobre casos de violência deve denunciar com o maior número de informações o possível: nome ou apelido da criança, quem é o responsável e endereço com ponto de referência, para que as equipes responsáveis consigam chegar até a criança em situação de violência e possam iniciar os cuidados necessários para retirá-la desse cenário.
Por definição do ECA, é considerada criança toda pessoa com até 12 anos incompletos. Para a preceptora do ISD Alexandra Lima, dentro dessa faixa etária existem ainda dois recortes que sofrem formas distintas de violação: as que estão na primeira infância, até os 6 anos, e as mais próximas da adolescência.
“Na faixa dos 0 a 3 anos, por exemplo, existe muito mais a negligência, a falta de cuidado. Quando as crianças ainda não podem reclamar e não têm discernimento do que precisam para seu bem estar e sobrevivência, ocorrem muitos casos de omissão, como não dar banho, não levar ao médico ou não dar comida. Já a criança mais velha, sabe que o responsável tem que dar comida para ela, tem que levar para escola... Então ela vai questionar usando uma outra forma de comunicação, e isso pode refletir em uma violência física”, explica.
Em muitos casos, as violações variam de acordo com o que a criança expressa, de que forma expressa e o quanto consegue entender em que situação se encontra. Por isso, considerando as impossibilidades de autonomia e discernimento de muitas crianças, é importante, enquanto sociedade, manter um olhar de alerta - seja vizinho, família, escola ou unidades de saúde, para garantir a proteção dessa população.
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