Por CNN
O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis recebeu o Prêmio da Amizade do governo da China, a maior honraria entregue a um especialista estrangeiro, pela implementação do projeto Andar de Novo no Hospital XuanWu, um dos maiores centros especializados no cérebro no país.
Nicolelis participou de uma cerimônia para receber a medalha no dia 25 de janeiro, tendo comparecido também a um jantar com autoridades do país no dia 26. O brasileiro ficou sentado entre o primeiro-ministro Li Qiang e o chanceler Wang Yi.
Em entrevista à CNN, Miguel Nicolelis destacou que os resultados conquistados na China foram “espetaculares” e devem ser publicados nos próximos meses. Ele contou que pacientes com paralisia total evoluíram para paralisia parcial, e alguns conseguiram andar sem exoesqueletos, apenas com pequenos apoios.
“Isso mostra que, como a gente tinha previsto 2014, as interfaces cérebro-máquinas não invasivas, que não requerem implantes neurocirúrgicos, funcionam muito bem e permitem a reabilitação de um número muito grande de pacientes”, comemorou.
O médico conversou com o premiê e o chanceler da China por cerca de uma hora. À CNN, revelou que eles consideram a área de interface “cérebro-máquina” estratégica para o país, tendo demonstrado profundo conhecimento sobre ela.
“Foi uma conversa surpreendente. Eu nunca tive uma conversa tão profunda sobre neurociência com políticos, em lugar nenhum do mundo”, avaliou.
Ainda sobre ter recebido a honraria, o neurocientista relatou que foi uma grande emoção e que nunca havia participado de uma cerimônia do tipo. Segundo explicou, esse é um grande evento no calendário pré-ano novo chinês.
“Realmente demonstrou um apreço não só comigo, mas com todos os outros cientistas que foram premiados, que eu nunca tinha visto. Então foi uma emoção muito grande e, como brasileiro, me senti de certa maneira representando a ciência brasileira”, celebra.
DeepSeek é mudança no eixo global de ciência e tecnologia, diz Nicolelis
Miguel Nicolelis estava na China quando as notícias do lançamento da inteligência artificial DeepSeek repercutiram no mundo inteiro e abalaram as ações de empresas de tecnologia.
A startup apresentou um modelo de IA semelhante ao ChatGPT, chamado R1, que tem todas as habilidades dele, operando a uma fração do custo dos modelos da OpenAI, Google ou Meta, por exemplo.
“Eles [DeepSeek] desmontaram o business plan das Big Five americanas, que diziam que para fazer o que eles fizeram era preciso centenas de bilhões de dólares, criar data centers gigantescos, cobrar uma fortuna dos usuários. Eles puseram no open source”, ressaltou o especialista à CNN.
O neurocientista fez referência às principais empresas de tecnologia dos EUA, chamadas Big Five, cujas ações tiveram queda expressiva após o lançamento da DeepSeek.
Nicolelis afirmou que essa foi uma mudança no eixo global de ciência e tenologia semelhante ao pouso na Lua ou então ao lançamento do satélite Sputnik.
“Logo a seguir, outras empresas — Alibaba e outras — começaram a soltar os seus modelos [de IA]. Então não vai ser o único modelo chinês a surpreender o mundo. E tudo feito num modelo de negócios completamente diferente”, comentou.
“Então, não é à toa que a Bolsa de Valores americana na segunda-feira seguinte ao anúncio perdeu 1 trilhão de dólares. Porque ficou claro que você não precisava dos chips de última geração para rodar esses modelos [de IA], eles usaram chips de uma geração muito menor, muito mais antiga. E agora eles estão dizendo que vão usar chips chineses produzidos lá”, adicionou.
Governo chinês demonstrou “interesse em parcerias com o Brasil”
À CNN, Miguel Nicolelis também revelou que presenciou o interesse do governo da China em estabelecer uma série de parcerias com o Brasil.
Ele pontuou que, um dos motivos para isso, é porque a China não tem abertura para novas “parcerias grandiosas” com os Estados Unidos e a Europa, por exemplo, mas que os chineses estão cientes que o Brasil possui uma das maiores redes de universidades públicas do mundo, onde grande parte da pesquisa de ponta nacional é feita.
“O Brasil surge como uma alternativa espetacular, mesmo porque as relações com o Brasil são muito boas, e as relações, por exemplo, com a Índia não são tão boas. Então, o Brasil é um é um parceiro claro”, ressaltou.
Ainda assim, o neurocientista alertou que é necessário fornecer os recursos necessários para as universidades brasileiras, visando tanto seu desenvolvimento quanto o da ciência nacional.
Além disso, para que as parcerias com a China sejam melhor estabelecidas, são necessários interlocutores que consigam” fazer a ponte” com o governo brasileiro.
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