Advogado afirma que sem uma situação de inequívoca gravidade sanitária, não há como impedir as campanhas eleitorais. Canindé Maia também analisa outras aspectos da sucessão municipal como os pedidos de impugnação de candidaturas apresentados pelo MPE
O advogado com atuação no ramo do Direito Eleitoral Francisco Canindé Maia é o entrevistado deste domingo da seção “Cafezinho com César Santos”. Na conversa a seguir, o especialista avalia as movimentações nesses primeiros dias do pleito de 2020, esclarece dúvidas sobre as atividades de campanha, e afirma que “a disputa eleitoral é inerente ao processo eleitoral. Sem uma situação de inequívoca gravidade sanitária, não vejo como impedir as campanhas eleitorais”.
Canindé Maia, que em 2014 chegou a solicitar pedido de registro de candidatura ao cargo de vice-prefeito na chapa com a então prefeita cassada e afastada Cláudia Regina (DEM), também avalia, entre outros pontos, o imbróglio jurídico enfrentado atualmente pela ex-prefeita, que teve o seu pedido de candidatura impugnado pelo Ministério Público Eleitoral, “questão essa que com certeza terá que ser enfrentada pelo TSE”, destaca o advogado. Acompanhe.
Como advogado com atuação no ramo do Direito Eleitoral, como o senhor avalia a manutenção das eleições municipais para este ano, com a campanha inclusive já nas ruas, apesar da pandemia?
Para que as eleições não ocorressem este ano muitas questões teriam que ser analisadas, como a questão de quem administraria as cidades a partir de 1º de janeiro. A pandemia aqui em nosso estado e principalmente em nossa cidade vem sendo controlada e os casos vêm diminuindo. O Ministério Público Eleitoral tem recomendado que sejam seguidas as regras sanitárias, inclusive os partidos e coligações receberam da Secretaria de Estado da Saúde, através do Comitê de Especialistas para o enfrentamento da pandemia, recomendação com análise da tendência da pandemia no estado. Com todas essas medidas, tudo transcorrerá sem maiores problemas e a democracia se consolidará.
Como o senhor analisa esses primeiros dias de campanha? Aglomerações foram e estão sendo registradas, principalmente pelo interior...
Vejo com preocupação. Aqui em nossa cidade, vejo as coligações e candidatos procurando seguir as regras sanitárias e orientações; já houve algumas reuniões sobre o tema com a Vigilância Sanitária e com a Justiça Eleitoral, que envolveu todos os atores do pleito. Mais preocupante é em outras cidades do interior do estado, onde já foi registrada verdadeira micareta nas movimentações políticas, mas tudo é questão de bom senso e que conseguiremos conduzir o pleito deste ano com toda segurança necessária a não proliferação da pandemia.
Muitos eleitores ainda têm dúvidas sobre o que é permitido, o que não é. Muitos perguntam: “nessas eleições, teremos carreatas, comícios?”. O que diz a legislação a respeito desses questionamentos? O que os candidatos estão autorizados a fazer?
Todas as atividades da campanha eleitoral estão permitidas, claro que com observação das regras sanitárias, inclusive na última quinta-feira, 1º, recebemos uma recomendação do Promotor Eleitoral da 33ª zona direcionada aos dirigentes partidários que diz que “os atos de propaganda eleitoral não poderão ser limitados pela legislação municipal ou pela Justiça Eleitoral, salvo se a decisão estiver fundamentada em prévio parecer técnico emitido por autoridade sanitária estadual ou nacional”, então, todas as atividades previstas na lei eleitoral e em resoluções do TSE estão permitidas. Por outro lado, não se pode perder de vista que as eleições livres são sinais da democracia, que não pode ficar comprometida pela ausência de informações aos eleitores e difusão das ideias dos candidatos.
Decretos municipais em Caicó e Florânia impedem eventos eleitorais como comícios, passeatas, carreatas, reuniões, entre outros. Esses decretos batem de frente com a Lei 9.504/1997 e a Emenda Constitucional nº 107/2020 que estabelecem essas atividades de campanha eleitoral. O que deve prevalecer, decretos municipais ou a lei federal?
A lei eleitoral é clara ao estabelecer que “a propaganda exercida nos termos da legislação eleitoral não poderá ser objeto de multa nem cerceada sob alegação do exercício do poder de polícia ou de violação de postura municipal”. Assim, é polêmica essa questão que merece todo o cuidado dos tribunais, obviamente dependendo da fundamentação técnica e jurídica de cada um desses decretos, caso haja judicialização. Não podemos perder de vista que a legitimidade das eleições é decorrente de eleições livres e do eleitor bem informado.
Como pode ser resolvido esse conflito entre decretos municipais e leis?
O poder de polícia sanitária exercida pelos municípios tem de estar respaldado na lei. O STF interpretou que os Estados e Municípios podem, e devem, adotar as medidas para combater a disseminação do vírus. Também, a Emenda Constitucional n. 107 estabeleceu que, se as condições sanitárias de um Estado ou Município não permitirem a realização das eleições, outra data poderá ser estabelecida pelo TSE. Assim, falando em tese, a depender das condições sanitárias de cada lugar, os decretos encontrarão ou não respaldo jurídico.
O senhor, que tem experiência em campanhas eleitorais, acredita ser possível impedir passeatas, carretas e outras manifestações em municípios onde é alta a temperatura da disputa eleitoral, como já visto na presente campanha?
A disputa eleitoral é inerente ao processo eleitoral. Sem uma situação de inequívoca gravidade sanitária, não vejo como impedir as campanhas eleitorais.
Na visão do senhor, qual o peso das redes sociais, das ferramentas virtuais de forma geral, nesse contexto de eleições em meio a uma pandemia?
Essencial. A própria população brasileira vem usando as ferramentas virtuais como meio de comunicação. No caso de nossa cidade, o número de pessoas que usam redes sociais é muito grande. Não sei estimar qual o percentual da população, mas que hoje a mensagem das redes sociais chega de forma instantânea, mais rápido e mais eficaz que o material impresso, com uma vantagem de evitar o contágio através do contato.
O número de fake news vem crescendo a cada eleição. Este ano, que estamos atravessando uma pandemia e com o crescimento também de crimes virtuais, o que um candidato pode fazer para se prevenir legalmente?
O TSE vem orientando, inclusive com campanhas em parceria com agências de checagens de informação para evitar a disseminação das notícias falsas; como dica dada pelo próprio TSE é verificar o site chamado “fato ou boato”. Esse site será dedicado a fazer checagens, então, é importante que os candidatos e assessores verificarem tudo antes de publicar ou compartilhar. Lembrando que o aplicativo “Pardal” do TSE é um instrumento para que qualquer cidadão possa comunicar ao Ministério Público Eleitoral, com provas, as irregularidades que encontrar. Por outro lado, a partir desta eleição vai vigorar a lei que criminaliza as fake news, e o Ministério Público deve ficar atento, inclusive quanto ao recebimento de falsa comunicação de ilícito eleitoral.
O comportamento do eleitor, como o senhor tem identificado até o momento? Ele está mais atento? Mais consciente?
Sim, o eleitor brasileiro sempre foi muito consciente e atento à cena política. Hoje, com o advento das redes sociais ele está cada vez mais bem informado. Mas, lembramos sempre que é muito importante verificar as informações antes de postar ou transmitir em grupos.
Com a campanha em andamento, quais são as condutas vedadas a agentes públicos que estão disputando um novo mandato, como prefeitos, vereadores?
Primeiro, é saber o conceito de agente público; de forma genérica, são todas as pessoas que exercem função pública, mesmo que de forma transitória. A lei eleitoral fixa todas as condutas vedadas. As mais importantes neste período são: ficam proibida a publicidade institucional dos atos praticados por estes agentes, ressalvado as informações relativas ao combate à pandemia da Covid-19, proibição de nomeação de aprovados em concursos públicos e outras condutas que possam configurar abuso de poder político. E todos, mesmo os que não têm mandato, devem evitar o abuso de poder econômico e midiático.
Sobre o Poder Legislativo, teremos esse ano 23 vagas em disputa na cidade de Mossoró. O senhor considera essa uma mudança positiva?
Sim, no momento que a população de Mossoró atingiu 300 mil habitantes, aumenta a representação desta na casa Legislativa, como prevê a Constituição. Com esse aumento esperamos que o debate dos problemas da cidade e os anseios de nossa população sejam o norte deste novo legislativo que tomará posse em 1º de janeiro.
Explique o porquê dessa mudança no quantitativo de cadeiras na Câmara Municipal não significar aumento de custos para o erário municipal...
Primeiramente, é dizer que o percentual de repasse do duodécimo passou de 6% (seis por cento) para 5% (cinco por cento) de parte da receita do Município; a Constituição especifica a base de cálculo, não é a totalidade das receitas. Por outro lado, as despesas de certo aumentarão internamente, mas que todos esses custos não serão suportados pelo erário municipal, pois o percentual é definido na Constituição Federal e será menor que o atual.
Em 2014, o senhor chegou a solicitar pedido de registro de candidatura ao cargo de vice-prefeito na chapa com a então prefeita cassada e afastada Cláudia Regina (DEM). O pedido não prosperou. Hoje, Cláudia é candidata, mas já há questionamentos sobre a legalidade dessa candidatura. Qual a avaliação jurídica que o senhor faz da situação da ex-prefeita?
Por dever esclareço que mesmo com as dificuldades impostas pela situação de 2012, tivemos todo o apoio de Rosalba e Carlos Augusto ao projeto de Cláudia em 2014. Quando o TSE negou a liminar para o registro, Rosalba não declarou apoio a nenhum candidato, ficando ao lado de Cláudia naquele momento, que também optou por não apoiar ninguém naquele ano. Quanto à questão jurídica do caso, faltou no momento de registro a questão da prova de elegibilidade, segundo entendeu o Ministério Público Eleitoral, que é o pleno exercício dos direitos políticos, questão essa que com certeza terá que ser enfrentada pelo TSE.
Caso queira acrescentar algo que não tenha sido perguntado, fique à vontade.
Primeiro, agradecer a oportunidade de falar sobre um tema que me é muito caro, desejar a todos os envolvidos no pleito municipal de 2020 boa sorte, que estes saibam orientar os seus apoiadores a seguir e observar as regras sanitárias para a realização dos eventos políticos.
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