Quinta-Feira, 28 de março de 2024

Postado às 11h30 | 10 Jan 2021 | Redação Marleide Cunha: ‘Não se pode fazer educação com os diretores sendo ainda cargos políticos’

Vereadora defende democratização da gestão escolar com eleição direta para diretor e vice-diretor. Marleide afirma que a educação será uma das bandeiras de luta do seu mandato na Câmara Municipal de Mossoró. Ela também fala sobre ser ou não oposição

Crédito da foto: Reprodução Marleide Cunha está no Cafezinho com César deste domingo, 10

Por Maricelio Almeida - Repórter do JORNAL DE FATO

A sindicalista Marleide Cunha, eleita em novembro de 2020 vereadora de Mossoró com 1.528 votos pelo Partido dos Trabalhadores (PT), é a entrevistada da semana da seção “Cafezinho com César Santos”. A vereadora que assumiu o mandato há poucos dias e já ocupa uma importante função na Mesa Diretora da Casa Legislativa, aborda na conversa a seguir pontos como o pedido de audiência com o prefeito Allyson Bezerra (Solidariedade), protocolado em nome do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mossoró (SINDISERPUM), e ainda não respondido.

A vereadora também reforça o que já vem declarando antes mesmo de assumir o mandato: não adotará uma postura de situação ou oposição ao governo Allyson sem que antes avalie as ações e o comportamento do novo gestor. “Quem me conhece sabe que eu não me calo diante de injustiças, eu não me calo diante de abuso de poder, não me calo diante de desrespeito aos direitos, desrespeito à democracia. Então, são as ações que vão me guiar nessa tomada de decisão. Para mim, não é o suficiente apenas a questão ideológica”, disse.

Marleide ainda fala sobre o papel da mulher na política, relembra o título de persona non grata atribuído a ela pela Legislatura passada e garante: “O povo de Mossoró pode esperar do mandato de Marleide Cunha uma voz forte, combativa e destemida em defesa dos serviços públicos, dos direitos da população, da dignidade humana e da democracia”. Acompanhe.

A senhora protocolou, enquanto presidente do Sindiperum e vereadora, dois ofícios no Palácio da Resistência (foto acima), cobrando audiências com o prefeito Allyson Bezerra para tratar de pautas como o pagamento de pendências salariais e reivindicações da Educação. Sobre os salários, o que há de pendência no momento?

Como presidenta do SINDISERPUM, sindicato que legalmente representa os servidores públicos municipais de Mossoró, eu protocolei o ofício 01/2021, ofício este que solicita audiência com o prefeito Allyson Bezerra, para que a gente possa determinar a data de pagamento dos salários atrasados dos servidores municipais. A gente tem informações que estão atrasados o 13º para quem ganha acima de três mil reais, porém também há servidores que recebem menos de três mil e que dizem que não receberam o 13º completo, que há muitas inconsistências nesse décimo. É difícil no momento saber se realmente procede, porque os servidores ainda não tiveram acesso aos contracheques do mês de dezembro. Então, nós também queremos solicitar rapidamente, urgentemente, que sejam liberados os contracheques, para que se possa saber se realmente foi pago correto ou não. Além do 13º, também tem a insalubridade de todos os servidores que têm direito a essa insalubridade, tem a insalubridade Covid, que é aquela para os profissionais da linha frente do combate à Covid-19, estão atrasadas também as diárias operacionais intrajornada da guarda e rescisão também de contratos temporários que foram encerrados e a Prefeitura não pagou aos servidores, nem 13º salário e nem nada relativo à questão de férias. Há uma angústia muito grande nesse sentido, algumas inconsistências que a gente não tem informações concretas, porque, como eu já disse, faltam os contracheques para comparar com os extratos bancários.

 

Quanto à pauta da Educação, quais são os principais pontos que constam nessa pauta?

Protocolamos o ofício 02/2021, que trata da pauta de reivindicação dos profissionais da educação, pauta esta elaborada em assembleia no dia 23 de dezembro com uma forte e efetiva presença dos professores, discutindo as demandas, as necessidades da educação, para se ter uma educação de qualidade. Os principais pontos, eles passam por questão de direitos e valorização dos profissionais, como a questão da revisão do piso salarial, para que a gente possa reverter um processo de desvalorização criado na gestão anterior, quando descumpriu o piso nacional. Isso precisa ser corrigido. Além disso, nós também reivindicamos o cumprimento do plano de carreira, no sentido de a Prefeitura publicar e pagar as mudanças de classe de 2018, 2019 que não foram publicadas, não foram pagas e isso causa um prejuízo, uma desvalorização dos professores. Também solicitamos construir a discussão, a formação de uma comissão para gestão democrática, com eleição direta para diretores de escola, que é fundamental para melhoria da qualidade da educação. Não se pode fazer educação com os diretores sendo ainda cargos políticos, isso ainda é um absurdo, é muito antigo, coloca a educação pública em atraso. Nós também reivindicamos o pagamento do prêmio 14º salário para as escolas premiadas, que vem desde o ano-base de 2017 que não foi pago, e atualização do auxílio deslocamento dos profissionais da zona rural.

Que outros pontos constam na pauta?

Nós queremos que a Prefeitura trate com mais zelo as escolas municipais. Então, nós queremos reforma nas escolas e adequação da escola e unidade de educação infantil a um ambiente educativo saudável. Escola suja, cheia de mato, com as paredes caindo, com a fiação elétrica exposta, isso coloca em risco a vida das crianças e esse ambiente desarrumado, desorganizado, é um ambiente que deseduca. Isso precisa ser revisto. Também reivindicamos que as aulas presenciais só devem acontecer após a vacina, porque nós não vamos colocar em risco a vida das crianças e a vida dos profissionais. Os professores reivindicam um calendário do pagamento do ano de 2021, não só para educação, mas para todos os servidores municipais. E queremos o retorno do desconto em contracheque da contribuição sindical mensal. Foi uma perseguição ao sindicato, realizada pela gestão anterior, sem a autorização dos servidores. Então, os servidores querem o retorno dessa contribuição nos seus contracheques. Da mesma forma como já existem outros descontos nos contracheques, apenas o sindicato é que a gestão passada retirou. Isso precisa ser corrigido. Além disso, há outros pontos, como concurso público, o Sindiserpum ter assento no Conselho Municipal de Educação; pagamento da rescisão dos aposentados, pois há aposentados que encerram seus contratos, por tempo de serviço, se aposentam e a prefeitura não paga, isso é um absurdo e tem ainda desde 2017 até hoje pessoas que não receberam sua rescisão, os restos a pagar. E a gente sabe também que a Prefeitura pagou por cara, pagou pra algumas pessoas que tinham interesses, e isso fere o princípio da impessoalidade, por isso é um ponto importante que está na pauta de reivindicação, entre outros.

 

Já houve resposta, retorno por parte do Executivo, quanto a esses ofícios?

Até hoje* (a entrevista foi concedida no dia 8 de janeiro), o prefeito ainda não respondeu aos dois ofícios, não respondeu a solicitação de audiência. Nós estamos na primeira semana e a categoria ainda está dando um tempo que acha que é justo para que o novo prefeito tome pé da situação, conheça como está pegando a situação da Prefeitura, mas ele precisa marcar a audiência, isso é fundamental, até para que a gente, para que a categoria realmente perceba como é que o prefeito vai atuar em relação aos servidores públicos. Ele precisa marcar a audiência, precisa para demonstrar para os servidores públicos que estará aberto ao diálogo, que realmente respeitará as instituições. A categoria, por enquanto, está aguardando, mas tudo isso tem um tempo, tem um tempo de paciência e a gente está por enquanto aí na expectativa. Esperamos que o prefeito entenda a importância de responder a esses ofícios e de agendar essa audiência.

 

A gestão Allyson Bezerra recebeu na última sexta-feira, 8, mais de R$ 2,2 milhões do FUNDEB. A senhora acredita que com esses recursos o prefeito quitará o 13º da Educação?

Os recursos que entraram na conta do FUNDEB são suficientes e sobram para pagar o 13º dos profissionais da educação. E o prefeito deve pagar, porque os professores não perdoarão se ele não fizer isso. Agora, essa informação de dois milhões, não é só isso que tem na conta do FUNDEB. É preciso ser bem claro com esses números. Nos dias 30 e 31 dezembro entraram recursos na conta do FUNDEB. Esse dinheiro no mês de dezembro também daria para ter pago o 13º dos profissionais da educação, mas não foi pago, porém o dinheiro entrou na conta, então ele deve ter lá. No dia 30 dezembro, entrou um milhão, trezentos e oitenta e três mil, novecentos e sessenta e três reais. No 31 de dezembro de 2020, entrou na conta do FUNDEB duzentos e noventa e sete mil, oitocentos e sessenta e oito reais. Se nós pegarmos do dia 30 de dezembro até hoje, então o dinheiro que tem na conta do FUNDEB totaliza três milhões, novecentos e setenta e nove mil, cento e oitenta e cinco reais.

 

Um volume expressivo de recursos...

E por que que eu estou dizendo isso? Porque a gente não pode contar o dinheiro do FUNDEB apenas a partir do início de 2021. A última cota do FUNDEB entrou na conta de 2020 e é para ter ficado lá. Portanto, tem dinheiro suficiente pra pagar o 13º dos profissionais da educação. E mais outra coisa, o dinheiro da educação não é apenas o FUNDEB, e a gente trata, discute muito o FUNDEB, porque ele é recurso vinculado, mas além do valor do FUNDEB, a Prefeitura ainda tem que investir em educação 25% de outros impostos, que não estão na cesta do FUNDEB. E aliás, não só 25%, a Prefeitura tem que investir em educação 30%, que é lei municipal. Portanto, os recursos da educação eles devem ser aplicados na educação, não faz sentido nenhum ter atraso salarial dos profissionais da educação, não há motivo para isso, a não ser que se esteja agindo de má fé e não utilizando os recursos de maneira correta. Então, reafirmo que o último salário pago pela Prefeitura de Mossoró, foi no dia 18 de dezembro, se não me falha a memória, depois disso entraram recursos na conta do FUNDEB e eles devem estar lá e, portanto, o prefeito deve pagar o mais rápido possível os profissionais. Não vamos aceitar o discurso de esperar até o final do mês, porque até o final do mês vão entrar os outros recursos que deverão ser pagos os salários do mês, das férias, hoje já tem dinheiro na conta do FUNDEB suficiente.

 

A senhora tem evitado se posicionar como situação ou oposição a governo Allyson, pelo menos nesse primeiro momento. O PT foi adversário do prefeito durante o pleito e correntes do partido defendem esse distanciamento também durante a gestão. Quando a vereadora Marleide Cunha deve definir sua posição na Câmara em relação ao Executivo?

Se as pessoas forem honestas na sua interpretação sobre as minhas falas nessa questão de oposição ou situação, se as pessoas se livrarem, se libertarem das suas amarras, de seus interesses politiqueiros, vão perceber que a única coisa que eu disse, que fui firme desde o início, porque a convicção é de que eu acho precipitado definir-se situação ou oposição quando um governo nem tinha começado ainda, quando a gestão nem tinha começado ainda e que a gente não tinha como ter elementos para justificar uma situação ou uma oposição. Quem me conhece sabe que eu não me calo diante de injustiças, eu não me calo diante de abuso de poder, não me calo diante de desrespeito aos direitos, desrespeito à democracia. Então, são as ações que vão me guiar nessa tomada de decisão. Para mim, não é o suficiente apenas a questão ideológica, eu continuo afirmando isso, é importante, nós temos diferenças ideológicas fortes, porém a gente precisa complementar isso e ver esses elementos na prática, no cotidiano, atingindo a vida das pessoas. E se atinge a vida das pessoas de forma negativa, ferindo a dignidade humana, ferindo as liberdades, então com certeza eu vou estar atuando com muita firmeza na defesa dos direitos, na defesa da dignidade humana, na defesa da democracia. O dia a dia, a prática vai nos conduzindo no caminho.

Qual a avaliação que a senhora faz desses primeiros dias de gestão Allyson Bezerra? Há alguma ação que a senhora destacaria com positiva?

Eu não faço avaliação precipitada, toda avaliação requer um julgamento, um juízo de valor e eu evito fazer juízo de valor com base nos achismos ou nas minhas convicções, eu prefiro esperar, prefiro ver as atitudes, analisar o discurso e depois ver se esse discurso se concretiza na prática. E para isso leva um tempo para a gente ver as atitudes acontecerem. No momento, acho que é cedo ainda, eu prefiro não incorrer em erros, fazer julgamentos que possam ser injustos. Então, eu prefiro aguardar, analisar e aí, depois, com dados concretos, aí sim, eu me posiciono. No momento, eu ainda não estou fazendo avaliações sobre o governo.

 

A senhora é uma das três mulheres eleitas em 2020 para o Poder Legislativo municipal, em meio a uma Legislatura com 23 parlamentares. Como a senhora avalia o papel da mulher no parlamento? Que bandeiras a senhora abraçará nesse mandato em defesa da mulher?

O fato de ter apenas três mulheres em meio a 20 homens na Câmara Municipal de Mossoró revela para nós o quanto as condições de disputas são desiguais em relação às mulheres. Não basta ter cotas para as mulheres nas chapas, sem dar as condições de se elegerem, porque se da forma como está não existe democracia representativa efetiva. No caso de Mossoró, a maioria do eleitorado é de mulheres, mas tem apenas três na Câmara Municipal e tem 20 homens, então não existe uma democracia representativa efetiva, isso precisa mudar. Eu pretendo trabalhar para que as mulheres possam ocupar os espaços políticos, espaços públicos importantes. E já comecei a fazer isso na Câmara Municipal quando conversamos e chegamos a um consenso que era importante ter uma mulher ocupando uma vaga na mesa diretora efetiva da Câmara, porque as mulheres não podem ficar em espaços sempre inferiores, é preciso que as mulheres estejam nos espaços de igual para igual com os homens. Isso é importante, é um longo trabalho que temos que fazer e vamos fazer. Além disso, é preciso também que as mulheres tenham condições de acesso ao trabalho, para que elas tenham autonomia, independência e possam viver sua vida com dignidade e com igualdade. Estaremos trabalhando nesse sentido.

 

E a senhora é hoje 2ª secretária na Mesa Diretora da Câmara Municipal de Mossoró. Como estão os trabalhos da equipe que irá conduzir a Casa Legislativa pelos próximos dois anos?

Olha, apesar da Câmara Municipal está em recesso parlamentar, os trabalhos administrativos estão acontecendo normalmente com tranquilidade, a Câmara está passando por reformas nos gabinetes, tem também criação dos dois novos gabinetes e a adequação dos gabinetes já existentes. A Mesa Diretora está trabalhando, já assinamos o quadro de detalhamento de despesas, que é a abertura do exercício financeiro para 2021, já foi publicado e nós estamos caminhando, tentando organizar a Casa toda para começar os trabalhos legislativos.

O título de persona non grata concedido pela Legislatura anterior à senhora foi revogado antes da senhora tomar posse como vereadora. Qual o sentimento e as lições que ficam desse episódio?

O sentimento é de profunda gratidão a cada pessoa que se indignou contra esse ato mesquinho, pequeno, covarde de vereadores e vereadoras que não tiveram escrúpulos em utilizar a Câmara Municipal como instrumento de vingança para alimentar o seu ego ferido. Isso o povo percebeu, foi à luta e me elegeu vereadora para poder corrigir essa injustiça, porque eu sei que o título persona non grata só foi revogado porque eu fui eleita e não porque as pessoas que fizeram isso reconheceram o seu erro e reconheceram a sua pequenez nessa atitude. Então, a lição de tudo isso, eu acho que é a lição de que o verdadeiro poder está nas mãos do povo, e nós que somos eleitos para representar o povo, nós só estamos lá a serviço dele e nós temos que honrar essa confiança.

 

Para finalizar, o que a população pode esperar do mandato da vereadora Marleide Cunha?

O povo de Mossoró pode esperar do mandato de Marleide Cunha uma voz forte, combativa e destemida em defesa dos serviços públicos, dos direitos da população, da dignidade humana e da democracia. Para isso, vou exercer uma ação consistente, fiscalizadora dos atos do Poder Executivo Municipal e da utilização dos recursos públicos, como também uma produção legislativa qualificada para que a gente possa trazer mais dignidade à vida das pessoas. O povo de Mossoró vai ver o que já conhece de Marleide Cunha, uma pessoa que atua com base em princípios muito sólidos, princípios de responsabilidade, compromisso com o bem comum, honestidade, solidariedade e autonomia. É o que eu já sou e vou levar isso para Câmara Municipal e colocar em benefício do povo de Mossoró.

 

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