Fábio Vale - Repórter do JORNAL DE FATO
Quem são as 85 pessoas que foram mortas de forma violenta somente nestes cinco primeiros meses do ano na segunda maior cidade do Rio Grande do Norte? Um levantamento do Observatório da Violência (OBVIO), repassado à reportagem com exclusividade, nos dá uma relativa percepção do perfil desse total de assassinados em Mossoró entre janeiro e maio de 2020.
Os dados mostram que por detrás destes números existem vidas que foram interrompidas por execução sumária, acerto de contas e ação do tráfico de drogas. Além disso, as estatísticas apontam que as armas de fogo predominaram em 80 casos, sendo apenas quatro restantes por arma branca e um carbonizado. O mapeamento do Obvio dá conta de que o primeiro homicídio de 2020 na Capital do Oeste aconteceu no dia 11 de janeiro e vitimou um homem pardo de 31 anos de idade.
Ele foi morto a tiros na Maísa, zona rural do município, em crime com características dita de execução sumária. No primeiro mês do ano, a entidade registrou outros oito assassinatos. Os crimes resultaram nas mortes de pessoas entre 20 e 70 anos de idade. Desses, dois casos foram definidos como latrocínio, que é o roubo seguido de morte.
Um vitimou um idoso no bairro Belo Horizonte e o outro terminou com a morte de uma mulher de 44 anos no Ouro Negro. A violência homicida na cidade seguiu em fevereiro, resultando em mais 16 novas mortes. Os casos interromperam as vidas de homens, com a faixa etária entre 25 e 46 anos, e os crimes foram classificados como acerto de contas, violência interpessoal e execução sumária.
Em março, também foram outras 16 pessoas mortas em Mossoró. Os ataques resultaram no óbito de homens entre 18 e 49 anos de idade, em sua ampla maioria solteiros e pardos. Uma mulher também foi morta dentro desse total. As ocorrências foram definidas como execução sumária, envolvimento com crimes, ação do tráfico, e envolvimento com drogas. Já em abril, foi praticamente uma média de uma morte por dia em Mossoró, totalizando 23 casos.
Além de ocorrências definidas como execução sumária e acertos de contas, houve também morte em alegado confronto com a polícia. E maio aparece com 23 pessoas mortas notificadas pelo Obvio. Desse total, a maioria se classifica como homicídio doloso, com características de envolvimento com drogas, ação do tráfico e execução sumária. O quinto mês do ano também teve duas mortes por intervenção policial e quatro vítimas de latrocínios.
Os roubos seguidos de morte interromperam as vidas de homens de 51, 33, 44 e 49 anos de idade nos bairros Barrocas, Paredões, Abolição e Alto do Sumaré. Uma dessas vítimas foi o operador de telecomunicação Aribanaldo Soares da Silva. Ele foi morto a tiro aos 49 anos por assaltantes e deixou irmãos, esposa, filhos e neta. Cerca de uma semana depois, o suspeito de ter atirado foi preso.
Especialistas avaliam que Mossoró vai na contramão do estado na redução da violência homicida
A segunda maior cidade do Rio Grande do Norte foi na contramão do estado na redução da violência homicida. É o que afirmam dois pesquisadores ligados à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Eles apontam que Mossoró não acompanhou a queda da violência no território potiguar entre 2015 e 2019 e associam esse quadro à presença de facções criminosas no município e ao desgaste das forças de segurança pública.
Jarvis Campos, demógrafo e professor da UFRN, e Ivenio Hermes, coordenador de análises criminais do Governo do RN e doutorando na UFRN, lembram que entre 2015 e 2017, o RN experimentou uma das maiores altas já observadas nas Condutas Violentas Letais Intencionais (CVLIs), aumento responsável, segundo ele, por colocar o estado no radar das violações dos direitos humanos e dos rankings internacionais de violência. “Já entre 2017 e 2019, a experiência foi a de forte redução, superando até mesmo o ano de 2015: entre 2015 e 2019 a redução das CVLIs foi de 13%, enquanto que, entre 2017 e 2019, a redução foi de 39,8%”, detalham.
Os estudiosos avaliam que, apesar da escalada da violência no estado, observou-se, portanto, uma redução da violência entre 2015 e 2019. “Mossoró, infelizmente, seguiu uma tendência contrária, qual seja a de aumento da violência neste período: em 2015, foram registradas 163 ocorrências de CVLIs, chegando a 249 casos em 2017, o que representou um aumento de 52,8%. Já entre 2017 e 2019, a redução foi muito mais tímida do que aquela observada no RN: foram 222 ocorrências em 2019, o que representou uma redução de apenas 10,8% entre 2017 e 2019 (contra quase 40% observado no Estado)”, enumeram.
Os pesquisadores esmiúçam ainda que ao analisarem as ocorrências dentro de Mossoró, os bairros com maiores níveis de violência, no período 2015-2019, foram Santo Antônio (com 12% das ocorrências), Rural Mossoró (11,9%) e Belo Horizonte (10,3%). “Mas, não é apenas as CVLIs que preocupam em Mossoró. Enquanto o RN observou uma diminuição de 7,2% das mortes matadas de mulheres e meninas, e uma diminuição de 19,6% na mortandade da juventude (12 a 29 anos), no período 2015-2019, Mossoró, infelizmente, teve um aumento de, respectivamente, 138% e 32%, no período em análise”, alertam.
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