Estudo “Mortandade da Juventude Potiguar, da revista OBVIUM, aponta que nos últimos cinco anos, 5.376 pessoas, com idades entre 12 e 29 anos foram mortas no Rio Grande di Norte, média de 1.075 vítimas por ano, ou seja, praticamente três casos por dia
Por Fábio Vale - Repórter do JORNAL DE FATO
“Quem matou Gabriel?” Essa foi uma pergunta que ressoou intensamente no decorrer desta semana no Rio Grande do Norte. O questionamento surgiu após o jovem Giovani Gabriel de Souza Gomes, de 18 anos de idade e morador da periferia de Natal, ser encontrado morto com marcas de violência, depois de nove dias desaparecido. Assim como Gabriel, quase 5.400 jovens tiveram a vida interrompida no território potiguar, nos últimos cinco anos.
O quadro assustador de violência letal intencional contra jovens no estado é constatado por um levantamento disponibilizado nesta semana pelo Observatório da Violência (OBVIO). O estudo “Mortandade da Juventude Potiguar 2015-2019”, edição 17 da Revista OBVIUM de junho de 2020, aponta que nos últimos cinco anos, 5.376 pessoas, com idades entre 12 e 29 anos, foram mortas no RN. Esse total equivale a uma média de um pouco mais de 1.075 vítimas por cada ano, ou seja, praticamente três casos por dia.
Dentro desse cenário, a situação é agravada ainda mais pelo fato de que a publicação de 66 páginas, que integra a série especial para subsidiar o Plano Estadual de Segurança Pública, reforçar que nesse “processo de extermínio da juventude”, como autores do estudo definem, o estado segue a tendência nacional ao atingir, principalmente, jovens negros e pobres. A pesquisa detalha que cerca de 90% das pessoas, entre 12 e 29 anos de idade, mortas no RN entre 2015 e 2019 se constituem da etnia parda e preta.
O mapeamento foi realizado pelo OBVIO a partir do cruzamento de dados de diversas fontes governamentais e não-governamentais, como Datasus, Segurança Pública Estadual, ITEP, SISOBI, Ministério Público e algumas fontes jornalísticas previamente credenciadas. “Mas, e a juventude? Além da Covid-19 e seus impactos, que outras preocupações afligem esses sujeitos de direitos? Jovens, sobretudo, negros, continuam a morrer nas periferias do Rio Grande do Norte. Quem mata? Quem (ou quê) causa tanta morte? Quem se responsabiliza por elas?”, questionam Jenair Alves e Cláudio Roberto, pesquisadores ligados à UFRN, no texto de abertura da publicação.
RN teve aumento de mortes entre 2015 e 2017 e queda de 2017 para 2018 e 2019
O estudo “Mortandade da Juventude Potiguar 2015-2019” mostra que no primeiro ano pesquisado, 2015, foram registrados 967 jovens mortos. No ano seguinte, esse número saltou para 1.130; e cresceu mais ainda em 2017, chegando aos 1.398 crimes letais contra pessoas entre 12 e 29 anos. Em 2018, houve uma redução para 1.104 casos; caindo mais ainda no ano seguinte: 777, sendo o menor número dentro deste período de cinco anos.
O comparativo mostra um aumento de quase 17% de 2015 para 2016, e de quase 24% de 2016 para 2017. Já de 2017 para 2018 e de 2018 para 2019 foram registradas reduções de, respectivamente, 21% e 29,6%.O estudo mostra que a maioria dos jovens mortos nestes anos foi de etnia parda e preta. Do acumulado nos cinco anos, 3.177, ou seja, 59,1% eram pardos; e 1.677 ou 31,2% eram pretos, totalizando 90,3%.
Brancos aparecem em 9,5% dos casos. Para se ter uma ideia da enorme diferença entre as vítimas por etnia, dos 777 jovens mortos no estado no ano passado, 63 eram brancos e mais de 700 eram pardos e pretos. O estudo assevera que “a cor da pele é fator de risco para a população negra e parda no estado”.
“No Brasil, ser jovem, em especial jovem negro, significa também ser sujeito de diversas violações de direitos. A realidade do estado do Rio Grande do Norte não foge à regra e tem sido de uma dureza enorme para a juventude”, analisa em um trecho da publicação, Gabriel Medeiros de Miranda, que preside o Conselho Estadual de Juventude e exerce o cargo de subsecretário da juventude da Secretaria de Estado das Mulheres, da Juventude, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, acrescentando que “a tarefa de construir políticas públicas que permitam a superação do caráter de genocídio dos índices de mortes matadas de jovens potiguares é árdua e que exige o poder público e a participação ativa da sociedade civil.”
Quase 57% do total de pessoas mortas entre 2015-2019 no RN eram de jovens
Quase 57% do total de pessoas mortas entre 2015-2019 no RN eram de jovens. É o que revela ainda a publicação da Revista OBVIUM de junho de 2020 “Mortandade da Juventude Potiguar 2015-2019”. Segundo o estudo, das quase 9.500 pessoas mortas no estado nestes últimos cinco anos, mais de 5.300 eram de jovens. A pesquisa acrescenta também que do total de jovens mortos, quase 60% eram da faixa etária entre 18 e 24 anos.
Os outros 28% eram de jovens com idades entre 25 e 29 anos. E 12% dos jovens mortos eram da faixa etária entre 12 e 17 anos de idade. A grande maioria deles foi classificada pela publicação com o estado civil “solteiro” e a escolaridade “ignorada”, ficando o ensino “fundamental” em segundo lugar (28,9%). A classificação “sem atividade remunerada” figura em 63,5% do total de casos.
“Isso mostra como a violência pode estar atrelada à desigualdade econômica, à falta de investimentos na educação da nossa juventude e à elevada circulação de armas de fogos, além da falta de políticas públicas de permanência dessa juventude no mercado de trabalho”, avalia trecho do estudo. A publicação esmiúça ainda que a região Leste liderou com 61% das ocorrências, seguida do Oeste potiguar, com 22,6%.
Com relação aos municípios com maior número de casos, Natal concentrou quase 27% e Mossoró 11,5%. Parnamirim (7,4%), São Gonçalo do Amarante (6,4%) e Macaíba (4,7%) completam os cinco primeiros. O levantamento detalha também que quase 80% das mortes foram resultantes de homicídios, seguido de intervenção policial (8,9%); que arma de fogo foi o meio empregado em 92,1% das mortes; e que crimes classificados como ‘de encomenda’ representaram 42,1% das macrocausas da violência, seguida de “violência interpessoal”, “conflito polícia x criminalidade” e “ação do tráfico”.
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