Por César Santos/Da Redação
A queda de braço entre o Ministério Público Federal (MPF-RN) e a indústria salineira potiguar poderia ter melhor solução pela via do entendimento, resguardando os limites da legalidade que envolve as questões ambientes em áreas onde estão localizadas as atividades de extração de sal marinho, na região de Mossoró.
A crise entre o MPF e as empresas salineiras tem origem na Operação Ouro Branco, realizada em 2013 pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), sob a denúncia de que as atividades eram mantidas em áreas de preservação permanente (APPs), protegidas por lei e cujo uso não pode ser regularizado.
A operação rendeu uma ação patrocinada pelo Ibama na Justiça Federal, com pedido de multa milionária. Os salineiros e moageiros reagiram e acusaram o órgão de tentar encerrar a indústria salineira, responsável por uma das maiores importantes atividades econômicas no estado.
No início de 2019, o Ministério Público Federal ingressou com ações civis públicas contra 18 empresas salineiras, sugerindo um prazo de quatro anos, podendo ser prorrogado por igual período, para que os proprietários de salinas possam concluir a remoção sem que os empreendimentos percam sua viabilidade econômica. As áreas irregulares representam apenas 10% do espaço ocupado pelas salinas, segundo o MPF.
Para o diretor geral do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN, geógrafo Leonlene de Souza Aguiar, a judicialização do problema não seria o melhor caminho, na medida em que tanto afeta a atividades econômica como prejudica a aplicação de medidas legais de proteção ambiental. O próprio Idema, que também é réu na demanda jurídica, sofre com a judicialização. “A maior parte das salinas funciona com licenças do Idema, por isso, o MPF colocou o órgão no processo para levantar todas as inconsistências que poderiam ser identificadas em relação à indústria salineira”, explica, para ressaltar que o Idema apresentou a sua defesa através da Procuradoria Geral do Estado (PGE).
Leon Aguiar defende que o processo tenha um desfecho o mais breve possível, no sentido de permitir que as partes envolvidas preservem as atividades e cumpram a sua função. “É importante fechar esse processo, respeitando todas as condições legais, porque o Idema precisa continuar a realizar sua missão”, disse.
O diretor do Idema realçou que as licenças ambientais são importantíssimas, sob dois aspectos: “Uma é que as empresas precisam das licenças para tocar seus empreendimento, regularizar para fazer novos negócios; outra é que o Idema precisa emitir as licenças que são um elemento fundamental para o órgão agir para preservar os cuidados ambientais.”
Outro ponto levantado por Leon Aguiar é que o MPF moveu ação coletiva, quando, segundo ele, cada salina tem um caso diferente. “As circunstâncias caso a caso, e que têm que ser analisadas, e não promover uma condicionante da licença que ela seja genérica para todos.”
“Não vou dizer que a ação do MPF tem excesso porque eu não tenho o domínio de todo o processo, mas acho que o ideal é que cada salina tenha o caso analisado individualmente, para poder o Idema adotar as devidas providências. O caso a caso vai levantar, de fato, o que é que aconteceu de problema naquela salina, para se buscar melhor entendimento”, defendeu.
No entendimento do diretor do Idema, o processo deve se arrastar por mais tempo, uma vez que não há sinalização de entendimento entre as partes envolvidas. Leon disse que o ideal seria que as salinas adotassem medidas, conforme a situação individual, e que o MPF cedesse também um pouco, mas tudo dentro da legalidade. “Mas acho pouco provável que isso aconteça. Pela própria complexidade do processo, o MPF vai continuar acreditando naquilo que defende, e como a questão está judicializada, os salineiros vão esperar a decisão da Justiça.”
Operação Ouro Branco deu origem às ações do MPF
As ações civis públicas patrocinadas pelo Ministério Público Federal (MPF-RN) atingem 18 empresas salineiras na região de Mossoró. São elas: Cimsal; Salinor; Andrea Jales Rosado; Francisco Ferreira Souto; Irmãos Filgueira; União Refinaria; São Camilo; F. Souto; Salmar; Marisal; Norte Salineira; Brasisal; Socel; Salina Soledade; Salina Camurupim; Henrique Lage Salineira do Nordeste; Distribuidora Oceânica de Produtos Alimentícios; e Umari Salineira.
O MPF afirma que as salinas mantêm atividades em áreas de preservação permanente (APPs), que representam 10% do espaço ocupado pelas salinas.
O Ministério Público requer das empresas não só a desocupação das áreas, mas também a promoção de algumas compensações, a partir da elaboração de Planos de Recuperação de Áreas Degradadas (PRADS), conforme o que já foi mapeado e sugerido pelo Grupo de Trabalho do Sal (GT-SAL). Formada por especialistas do Idema e do Ibama (a pedido do MPF), essa equipe elaborou um amplo relatório a respeito do assunto.
De acordo com o documento, a área total pertencente às indústrias salineiras no RN soma 41.718 hectares, dos quais 30.642 são explorados pela atividade salineira, sendo que 3.284 (10,71%) se encontram em APPs (margens de curso d’água, florestas de mangue e dunas).
Os autores das ações, os procuradores da República Emanuel Ferreira e Victor Queiroga, lembram que “está em jogo (…) a regularização ambiental de nada menos que 2 mil hectares de ocupação irregular de áreas de preservação permanente, especialmente de apicuns e salgados que compõem o ecossistema manguezal”. Por outro lado, essa extensão representa apenas 10% da área ocupado pelas empresas, o que demonstra “que as intervenções no circuito da salina serão mínimas” e não pretendem tornar inviável o funcionamento das salinas.
As ações também pedem a concessão às empresas de um prazo de quatro anos para que concluam a desocupação das APPs, podendo ser prorrogado por igual período. Com isso, os empresários poderão promover os ajustes com menor impacto financeiro.
As ações são fruto da Operação Ouro Branco, desencadeada pelo Ibama em fevereiro de 2013. Um ano depois, o MPF realizou a primeira audiência pública sobre o caso, resultando na criação do GT-Sal, cujo objetivo era analisar as áreas ocupadas e contribuir na formatação de um termo de ajustamento de conduta (TAC). Uma segunda audiência, em março de 2017, serviu para a apresentação das propostas de TACs e dos termos de referência para a produção dos Prads.
Já em 2018, entre 22 e 23 de janeiro, foram realizadas reuniões para buscar a regularização extrajudicial e consensual entre as partes. “No entanto, houve frontal discordância das empresas acerca da obrigação de desocupar parte das áreas de preservação permanente ocupadas. Logo, não restou outra via a não ser provocar a jurisdição”, explica Emanuel Ferreira.
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