Lawrence Amorim afirma que a crise financeira da Câmara Municipal está acontecendo porque o prefeito ficou com 14 milhões e 600 mil reais da Casa. Ele aponta “retaliação”. Segundo o presidente, não há garantia de pagamento dos salários dos vereadores
Por César Santos - Jornal de Fato
Daqui a exatos dez dias, Lawrence Amorim (PSDB) concluirá o mandato de vereador e a gestão na presidência da Câmara Municipal de Mossoró. Ele tem, nesse curto tempo, a missão de resolver pendências financeiras da Casa, que sofreu com o esvaziamento de recursos, consequência do rompimento político com o prefeito Allyson Bezerra (União Brasil).
Para se ter ideia do tamanho do problema, os vereadores ainda não receberam os salários de novembro.
“Isso está acontecendo porque o prefeito ficou com 14 milhões e 600 mil reais da Câmara”, afirma Lawrence, para apontar que se não fosse a “retaliação” do chefe do Executivo, o Poder Legislativo estaria em situação confortável.
Na tarde de quinta-feira, 19, Lawrence Amorim tomou o “Cafezinho com César Santos” na sede do Jornal de Fato quando tratou sobre esse assunto e outros temas relevantes. Confira.
Há um desequilíbrio nas contas da Câmara, inclusive, os vereadores ainda não receberam os salários de novembro. A duas semanas de concluir a sua gestão, como o senhor entregará ao sucessor as finanças do Legislativo mossoroense?
Nós buscamos ajustar as contas da Câmara Municipal, controlar as finanças, no sentido de que não houvesse nenhum prejuízo ao funcionamento da Casa. Nós temos uma diferença de repasses do duodécimo, por parte da Prefeitura de Mossoró, da ordem de 14 milhões e 600 mil reais. Esses valores que compreendem os exercícios 2021, 2022 e 2023 são reconhecidos pelo Tribunal de Contas do Estado. Isso provocou um impacto muito grande. Veja que tivemos uma gestão com o maior número de vereadores da história da Câmara, no total de 23, quando antes eram 21 e agora, a partir de 2025, voltará aos 21 edis. Isso significa que tivemos uma despesa maior e a receita menor. Esse desequilíbrio trouxe consequências, nós estamos trabalhando com responsabilidade, aplicando os recursos públicos de forma correta, no sentido de entregar a Câmara ao nosso sucessor de forma organizada e equilibrada.
Como a Câmara pretende recuperar esses recursos que o senhor afirma que é de direito da Casa?
É preciso levar ao conhecimento público que além de não recebermos os valores do duodécimo de forma integral, conforme manda a Constituição, a nossa gestão ainda foi condenada pela Justiça a devolver recursos de exercícios anteriores. Estamos administrando a Casa com o duodécimo bastante reduzido. Isso nos obrigou a adotar medidas amargas para ajustar as contas. No entanto, chega um momento que as medidas não conseguem resolver todos os problemas. Mas nós vamos buscar na Justiça o que é de direito da Câmara. Não podemos aceitar que por capricho do chefe do Executivo, a Casa Legislativa deixe de receber mais de 14 milhões de reais. Veja que o ataque contra a Câmara vai além. O prefeito Allyson Bezerra nunca pagou as emendas impositivas dos vereadores. Isso significa um volume de recursos considerável. Mas o prefeito decidiu se apropriar desses recursos, descumprindo a Constituição, com o objetivo de tentar tirar a independência do Poder Legislativo. Essa perseguição política, imprimida pelo prefeito, afeta bastante a Câmara, então, temos que ter responsabilidade para administrar com os recursos que temos disponíveis e é isso que estamos fazendo. Em novembro, por exemplo, tivemos que fazer escolha e priorizamos o pagamento salarial dos servidores efetivos, comissionados e assessores, e deixamos de pagar o salário dos vereadores. Agora, estamos aguardando a última parcela do duodécimo e não sabemos como será depositada. Não sabemos o valor que vamos receber, não sabemos quais retenções serão feitas, então, essa imprevisão nos deixa sem saber como concluirá o ano.
O senhor afirma que o duodécimo da Câmara não foi cumprido nos anos de 2021 a 2023, com a Casa deixando de receber mais de R$ 14 milhões. Nesse período, o senhor era aliado do prefeito Allyson Bezerra. Por que, então, a situação não foi resolvida no diálogo entre aliados?
Nós tentamos mostrar ao prefeito que a Câmara Municipal tinha direito àquele valor, que representa 6% assegurado pela Constituição, mas o prefeito nunca acatou. Ele ficou jogando o caso para assessores e as informações que chegavam até nós é que a Prefeitura não podia fazer os repasses com base nos 6% da receita do município. Depois, transferiu para o Judiciário decidir a situação. Nós explicamos ao Judiciário que a Constituição é clara, mas não obtivemos êxito. Além disso, tivemos essa situação do número populacional de Mossoró que também nos afetou. O Censo por estimativa dizia que a cidade tinha mais de 300 mil habitantes, mas no Censo presencial dizia que não tinha. Ficou essa discussão, o tempo foi passando, e nada foi decidido. A Câmara acabou no prejuízo. Mas a gente sempre percebeu que o prefeito queria asfixiar a Câmara, queria reduzir o duodécimo da Casa, porque ele sabia que se a Câmara tivesse os recursos corretamente, ficaria mais independente para cumprir o seu papel, e isso o prefeito não queria. Na verdade, nunca quis.
Quando foi que o senhor entendeu que a relação com o prefeito Allyson estava deteriorada e não tinha mais como continuar?
Mesmo com as dificuldades financeiras nós conseguimos fazer investimentos para fortalecer a Câmara Municipal. Fizemos melhorias na estrutura da Casa para dar mais condições à atuação parlamentar. Nós buscamos dar mais transparência por meio da TV Câmara. Veja que hoje a TV Câmara, que é gerida pela Fundação Aldenor Nogueira, tem um patrimônio considerável. Nossa gestão sempre valorizou os servidores, sempre teve um diálogo respeitoso com vereadores de governo e oposição, mostrando que a Casa era a maior prioridade. Isso incomodou o prefeito e ele passou a retaliar a Câmara. Quando chegou o ano de 2024, vendo que o chefe do Executivo não queria dialogar com a Câmara, resolver as pendências financeiras e respeitar o direito do Legislativo, a gente teve a certeza que não havia mais condições de fazer política ao lado de uma pessoa com esse comportamento. No fim de 2023, nós tivemos na iminência de conseguir um documento com o Tribunal de Contas do Estado, que determinaria o percentual de duodécimo que a Câmara deveria receber. Naquele momento houve uma pressa muito grande por parte do Poder Executivo e de vereadores da base aliada, para antecipar a aprovação do orçamento de 2024, inclusive, queriam votar já em novembro, quando tradicionalmente o orçamento é votado no mês de dezembro. Aquela pressa era para que o orçamento fosse votado antes de chegar o documento da Corte de Contas, justamente para que o percentual de 6% não fosse cumprido. Isso comprova que o prefeito não tinha interesse de manter a relação política. Então, essa relação tinha que ser encerrada.
Mas, presidente, a Câmara, com maioria governista, acabou de aprovar o orçamento do município de 2025 reduzindo o duodécimo de 6% para 5%. Como o Legislativo pode reagir se a maioria vota de acordo com o Executivo?
Realmente, o Executivo enviou um projeto alterando o projeto de lei de diretrizes orçamentárias, dizendo que o repasse ao Poder Legislativo é até 5%. O artigo 29A da Constituição é muito claro: cidades com até 300 mil habitantes o duodécimo é de 6%. O prefeito não respeita nem a Constituição Federal.
Voltando para questão dos salários dos vereadores, que estão em atraso, o senhor acredita que agora em dezembro o pagamento será atualizado? A Câmara terá condições de pagar duas folhas com o último duodécimo do ano?
Nós não temos a menor ideia nesse momento, porque não sabemos como o prefeito Allyson mandará o duodécimo de dezembro. Não sabemos quais as retenções serão feitas, não sabemos quais valores serão respeitados pelo chefe do Executivo. No nosso planejamento, posso adiantar, nós vamos priorizar a folha salarial dos servidores e dos vereadores. Agora, se o duodécimo sofrer as retenções como ocorreu em novembro, a prioridade é o pagamento salarial dos servidores. A Câmara não estaria passando por essa situação se tivesse recebido os recursos corretamente. São 14 milhões e 600 mil reais que o prefeito deixou de repassar. Isso desequilibrou as contas do Poder Legislativo.
Os vereadores governistas, que são maioria no plenário, derrubaram projeto da própria Câmara que parcelava a dívida da Casa com o Previ-Mossoró, com isso, houve retenção de 600 mil reais em novembro, o que impossibilitou o pagamento dos salários dos próprios vereadores. O senhor já tinha visto uma Câmara votar contra ela mesma?
Não há na história algo sequer parecido. Isso vem acontecendo durante toda essa legislatura, fazendo com que a Câmara chegue a essa situação de crise financeira que vive agora. Como disse há pouco, uma votação na quarta-feira (18) os vereadores da base aliada aprovaram um projeto enviado pelo prefeito diminuindo em 1% o valor do duodécimo da Câmara. Veja que eles desrespeitam a Constituição e prejudicam as finanças da própria Casa que habitam, só para atender ao pedido do Poder Executivo.
Essa subserviência da bancada governista é a troco de quê?
Pode ser o comodismo ou achar que o problema não é deles também. O problema não é só do presidente, a Câmara é um colegiado, todos são afetados. O exemplo disso é que os vereadores não receberam os salários de novembro porque o prefeito diminuiu o repasse do duodécimo.
O prefeito Allyson Bezerra praticamente não teve oposição na primeira gestão e se reelegeu com mais de 78% dos votos válidos. Agora, para a segunda gestão, o senhor acha que o prefeito de Mossoró terá uma oposição mais forte?
Realmente, o prefeito passou quase três anos e meio de mandato praticamente sem oposição. Apenas alguns vereadores, sindicatos e alguns veículos de imprensa fizeram o contrapronto à gestão Allyson, mas sem uma oposição que o incomodasse. Faltou uma fala que cobrasse ao prefeito e que a população se sentisse representada com aquela cobrança. Isso criou a ideia na própria gestão que pode tudo. O prefeito fazer o que quer e até o que não pode; ele está se sentindo acima de tudo e de todos. No período eleitoral, Allyson fugiu do debate, evitou que os adversários fizessem o confronto de ideias, optando por permanecer nas redes sociais onde não existe o contraponto. Acho que a oposição deve se organizar para enfrentar o debate na segunda gestão do prefeito. E tem muita coisa para explorar. O próprio prefeito cria provas contra ele diariamente, basta ver a gestão fiscal do município de Mossoró que existe uma grande interrogação. É necessário que a oposição tenha um olhar atento e, de forma responsável, mostrar os desmandos que acontecem na gestão municipal. Temos investigações em andamento, provas que mostram coisas absurdas, entre outras, que podem ser exploradas por uma oposição responsável. É isso que vamos fazer.
O senhor pensa em liderar a oposição ao segundo governo Allyson?
Nós fomos candidato a prefeito, fizemos 45 dias de campanha e enfrentamos um adversário que fez três anos e cinco meses de campanha, usando toda a máquina pública. Isso é sabido e notório. Ele se preparou para a reeleição. Já o nosso projeto não era disputar a Prefeitura de Mossoró este ano, mas aceitamos o desafio e tivemos a coragem de representar um grupo nesse processo. Esse grupo não é toda a oposição de Mossoró, mas é formada por pessoas que têm responsabilidade com Mossoró, que querem o bem da cidade, por isso, aceitei a missão. Agora, a gente precisa se organizar melhor para fazer uma oposição responsável, representar todos aqueles que não aceitam o que está acontecendo com a cidade. A oposição é importante para o processo democrático porque é ela que fiscaliza, que investiga e que denuncia o que está errado. Nós vamos continuar a nossa atuação política, vamos fortalecer a oposição, ficaremos vigilantes em defesa de Mossoró. Vamos fortalecer o debate, vamos buscar novos nomes para pensar Mossoró e eu estarei inserido nesse processo.
Surgiu a especulação que o senhor iria assumir o cargo de destaque no governo Fátima Bezerra (PT), que apoiou a sua candidatura a prefeito. O que há de verdade? O senhor foi convidado?
Nós ainda não tivemos a oportunidade de sentar com a governadora Fátima após as eleições, para conversamos sobre o futuro político de Mossoró e do Rio Grande do Norte. Existe a especulação que eu considero normal, mas a gente não tem nada de concreto. Nós tivemos essa parceria durante a campanha municipal, a governadora nos deu o apoio, ficamos muito gratos a isso, e estamos à disposição para somar aos projetos futuros.
Quando concluir o mandato daqui a dez dias, o que senhor pretende fazer?
Como disse, vou continuar a minha atividade política. Mas nesse primeiro momento, pretendo me dedicar mais à minha profissão (advocacia) e à minha família. Eu comecei na política muito jovem e disputei seis eleições nos últimos anos. Então, chegou o momento de eu ficar mais próximo da família, mas, claro, sem deixar a atividade política.
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